Quando ele chegou eu já o esperava havia três horas. Entrou e me achou na sala, lendo o jornal.
Oi, tudo bem?
Tudo.
Não dei chance:
Vou sair pra jantar, estou morrendo de fome.
Não tem comida?
Não.
Quer pedir alguma coisa?
Não. Quero sair.
Calcei os tênis, vesti um casaco e saí. Só na esquina, quando as gotas embaçaram por completo as lentes dos óculos, dei pela chuva. Não corri nem procurei uma marquise. Era boa, até, a chuva, à noite, pelas ruas escuras e desertas.
Na vizinhança indigente de opções gastronômicas, fui para num filé com arroz piamontesa e bolinhos de queijo, num lugar onde uma lata de suco industrializado de goiaba custa incríveis quatro e cinqüenta. Comi com gosto, no meio de uma balbúrdia de pessoas. Tomei um sorvete de sobremesa, sem nem ligar para o troco dado em muitas moedas de cinco.
Não quis voltar imediatamente pra casa.
Ousei, passei no cinema, para ver se o horário batia com alguma coisa boa. Não batia. 6 salas, e nada. E eu não ia sair de um jejum de 9 meses sem cinema pra ver qualquer coisa. Entrei na livraria do cinema, onde decerto tenho grande afinidade com o livreiro, pois todos os livros que quero ler estavam dispostos lado a lado. Bernardo Carvalho, Cristovão Tezza, Luiz Ruffato, Carola Saavedra, Sandor Marai, Philip Roth, Paul Auster, Agualusa, Cees Nooteboom, um ao lado do outro. Suspirei com a angústia de quem não conseguiu ainda ler os livros todos ganhos no aniversário de 2007, que dirá ainda os que ganhei este ano (mas já comecei pelo Bioy que ganhei de A. & J.), e não comprei nada.
Voltei por uma rua diferente, debaixo da mesma chuva.
Sinto que a estação está mudando - dentro de mim, também.
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2 comentários:
Belo conto, aninha, gostei do estilo, da "sucintez" (caramba!), do jeito de pincelada no cotidiano. Enfim, gostei.
beijo,
clara lopez
Puxa,deu vontade de saber o resto.Ou o principio.Ou os dois.Adorei.
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