27.8.09

Inverno no Rio


Quem foi que disse que não tem mais foto de Mathilde?!

26.8.09

O método Elsève de educação infantil

Uso um creme no cabelo, da Elsève.
Um dia, olhando o pote, dentro do chuveiro, atentei para as promessas feitas pela L'Oreal para as consumidoras do produto: parece que o tal creme "Nutre, Alisa e Disciplina".
Que coisa.
Há mais semelhanças entre o que desejamos fazer com os cabelos e com os filhos do que jamais poderiam sonhar os redatores de potes de xampu.

25.8.09

A pílula falante do doutor Caramujo


Emília engoliu a pílula muito bem engolida, e começou a falar no mesmo instante. A primeira coisa que disse foi: Estou com um horrível gosto de sapo na boca. E falou, falou, falou e falou. Falou tanto que Narizinho , atordoada, disse ao Doutor que era melhor fazê-la vomitar aquela pílula e engolir outra mais fraca. Não é preciso – explicou o grande médico. Ela que fale até cansar! Depois de algumas horas de falação, sossega e fica como toda gente. Isso é fala recolhida que tem de ser botada para fora. E assim foi. Emília falou três horas sem tomar fôlego. Por fim calou-se.

Louvemos sempre Monteiro Lobato pelo maravilhoso conceito de "fala recolhida", atribuída aqui ao doutor Caramujo, o grande médico do Reino das Águas Claras. Porque só quem já presenciou uma fase como essa, numa criança, pode entender a extensão e a magnitude desse formidável processo que é a aquisição da linguagem.
Pelo pouco que entendo, não há muito consenso sobre como uma criança aprende a falar, sobre os mecanismos cognitivos que a fazer dominar esse complicado código do idioma. Mas minha experiência com Mathilde me diz: é muito rápido.
A impressão que tenho é que as crianças apreendem muito e desde muito cedo. Ainda bebezinhos, já memorizam palavras, e muito rapidamente captam seu significado. Tanto que, quando ainda não falam, já entendem e respondem a uma infinidade de instruções (deita, levanta, dá tchau, pega o seu travesseiro, etc.).
E aí, um belo dia, elas engolem a pílula falante.
Mathilde desatou a falar tudo e mais um pouco. É uma matraca. A sensação é que, de fato, a fala estava "recolhida", e ela agora se sente contentíssima por ser capaz de verbalizar. E tome de "levanta, mamãe", "quer subir", "quer água", "não, não, não", "a p(r)aia", "a Peppa", "teêvisão", "bauúio" (o aspirador ligado), "caiu tudo", "esse não", e o impagável "isso, mamãe, muito bem", quando, atendendo ao pedido dela, limpo com guardanapo as mãozinhas sujas de comida. E quando não tem mais "assunto", ela se contenta em simplesmente nomear as coisas. Aponta e fala: cadeira, mesa, prato, colher, ventilador, porta, bicicleta.
Naturalmente, com isso as manhas e malcriações não só se intensificaram como ficaram mais elaboradas, mais extensas e muito mais trabalhosas de lidar.
É incrível como, com essa coisa de filho, nada é mesmo por acaso, e nada vem de graça. Não tem ponto sem nó, e nada fica sem consequência.
E tudo é difícil, sim, mas as recompensas também vão ficando mais e mais sensacionais.

24.8.09

Antigos vícios

Começou na quinta-feira.
Noite fechada, escura, fria e molhada quando saí na Voluntários da Pátria para iniciar a caminhada de volta para casa. As poças formadas ao longo do dia inteiro de chuva me obrigavam a andar longe do meio-fio. O guarda-chuva aberto protegia da chuva fina e persistente.
Não sei bem o que me levou àquela esquina. Parada no sinal, do outro lado da rua, comecei a olhar para o vendedor. Talvez um acesso de nostalgia, uma vontade súbita de voltar a experimentar sensações há muito esquecidas e enterradas. Reviver parte da minha juventude -- quiçá infância!
Fazia muito tempo, de fato.
Ao longo dos anos fui me convencendo de que aquilo não prestava. Construí uma aversão psicológica, a ponto de não mais sentir qualquer vontade. Parecia-me algo imundo, repulsivo, até. Algo em nada condizente com meu status de profissional de sucesso, mãe de família, mulher bem resolvida. Ah, as enganosas auto-imagens que construímos.
E então assim, sem razão aparente, voltou a vontade. Atravessei a rua e me encaminhei decidida para lá. Envergonhada por minha desinformação, não tive alternativa senão pergintar: "Quanto é?". O vendedor respondeu, frio como a noite, "Tem de um e de dois reais". "Me vê um de um", respondi tentando aparentar normalidade. Escolhi a minha variedade preferida. Ele preparou e me entregou. Paguei, peguei e voltei as costas para ele, caminhando rapidamente na direção da São Clemente, procurando me afastar o mais rapidamente possível.
E pronto, o mal já estava feito.
Na sexta à noite, voltei. Hoje, segunda, também.
Mas amanhã é outro dia. E tentarei resistir ao churro com recheio de doce de leite da barraca do Dantas!
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13.8.09

Jacob


Hoje faz 40 anos que Jacob do Bandolim morreu.
Se não fosse pelo email de HBC, a data passaria em branco para mim.
Os que acompanham esse blogue hão de saber que fui, há algum tempo, atingida pelo vírus do choro, a música brasileira instrumental por excelência. Já faz anos que não cometo a gafe de chamar de "chorinho" e que batalho pela maior divulgação desse maravilhoso gênero musical, em especial do choro contemporâneo, tão bom quanto desconhecido do grande público (assunto que merece um post próprio, em breve).
Mas antes de chegar no choro de hoje, é claro, ouvi -- e ouço -- muito os grandes mestres, Jacob em destaque entre eles.
Jacob foi uma figura meio sui generis na roda dos chorões. Nasceu na Lapa, no seio da boemia carioca, mas de boêmio não parecia ter nada -- ao menos não na acepção mais desregrada da boemia, porque sabemos que ele era o rei do sarau. Começou a tocar bem cedo, logo passou a figurar na rádio com conjuntos regionais, teve sucesso, tinha bastante trabalho. Mas mesmo assim, resolveu não depender exclusivamente da música para prover o sustento da família: prestou concurso público e tornou-se escrevente juramentado da Justiça. Mesmo dando expediente na repartição, trabalhou muito pela música. Gravou, compôs, ensaiou, formou conjuntos, e o que é mais incrível: era um pesquisador nato. Dono de um arquivo fabuloso que juntou ao longo de toda a vida, era minucioso na sua organização, e graças a ele temos acesso a um sem-número de partituras, informações e fitas de rolo com gravações de choros dele e de outros, gravadas com o intuito de preservar. Dava saraus famosos em sua casa em Jacarepaguá.
Gravou muitos discos importantes e históricos. Tocava Ernesto Nazareth numa época em que isso não era muito comum (dedicou-lhe um disco inteiro). Homenageava chorões das gerações anteriores, como Anacleto de Medeiros e Joaquim Callado, de quem gravou, respectivamente, Três Estrelinhas e A Flor Amorosa, entre outras. Tocava sambas, acompanhava cantores, e compunha espetacularmente. Suas interpretações são, até hoje, "a" referência para qualquer bandolinista, mas não só para eles. Qualquer instrumentista de choro tem no Jacob um norte para a interpretação para um vasto repertório. Não exagerava, o Jacob -- tampouco fazia por menos. Dizia tudo.
Era um músico incrível.
As composições são um caso à parte. Sou fã devotada das músicas de Jacob. De seus choros ditos "clássicos", como Noites Cariocas ou A ginga do Mané (homenagem ao Garrincha), de suas valsas, como Pérolas ou Feia (de infeliz batismo), e mais ainda nos sambas-choro, gênero em que acho que ninguém o superou. Basta ouvir Bole-Bole, meu favorito, mas também Receita de samba, Diabinho maluco ou Treme-treme para poder dizer, sem medo: gênio.
O pessoal do Instituto Jacob do Bandolim faz um trabalho lindo de preservação de seu acervo, de sua memória e de sua música. Eles têm uma campanha para conseguir imagens em vídeo do Jacob. Por incrível que pareça, apesar de ter sido um artista "midiático" e muito conhecido em sua época, só se tem, até hoje, uma única imagem em movimento do Jacob, de poucos segundos: uma entrevista em que ele fala a um repórter - mas o áudio se perdeu. O IJB colocou no ar (reparem que ele parece estar saindo de cinema mostrando Os Sete Samurais!):



Outra gravação pra lá de clássica, lançada em disco (e CD), mas que não tem registro em vídeo, é o show do seu conjunto, o Época de Ouro, com Elizeth Cardoso e Zimbo Trio, no Teatro João Caetano, no Rio, em 1968. Desse disco, acho que a faixa mais conhecida, com justiça, é Barracão. Como no YouTube de tudo se acha, encontrei essa montagem que alguém fez, com imagens de favela (!). Esqueça as imagens, fique navegando, mas deixe tocar e preste atenção ao solo quando a Divina Elizeth fala "Dá-lhe, Jacob!":



Mas a verdade é que não se pode falar de Jacob e sua música sem mencionar Vibrações, de 1967, considerado por muitos o maior disco de choro de todos os tempos. É uma alegria ouvir de tempos em tempos esse disco. Como não existem videos do Jacob, e eu não sei postar audios, então quem quiser ouvir tem que correr atrás. Eu gosto muito. Nesse meio tempo, mais uns youtubes selecionados:

Diabinho Maluco



A Ginga do Mané




Noites Cariocas



Mimosa






12.8.09

Passeio no xópin

Fui fazer compras. De roupas para trabalhar, basicamente. Reconheci, um pouco a contragosto, que meu guarda-roupa dos anos 90 já está em estado de petição de miséria. Saiu da categoria vintage-cult para a categoria mendigagem-descaso.
Detesto comprar roupa. Foge-me à compreensão como as pessoas podem gostar. Bater perna, encarar vendedoras, experimentar roupa naquelas cabines! Sair para comprar roupa para mim é como ir ao supermercado. Sei que preciso, não há como fugir, na hora é um saco, e depois de terminado dá uma sensação de alívio e dever cumprido, e a alegria de saber que não precisarei mais passar por isso por algum tempo.
Como não compro roupa quase nunca, quando saio para comprar sempre digo a mim mesma que não vou economizar: se gostar de uma roupa, compro, não importa o preço. Afinal, é tão difícil achar uma coisa de que eu goste e com que me sinta bem. Mas na hora agá nunca funciona. No momento de pagar NOVENTA REAIS (ou mais, muito mais) por uma blusa, acho um escândalo e me recuso. Ou DUZENTOS E NOVENTA E CINCO REAIS por um par de sapatos. Sei lá. Não consigo.
Mas dei sorte, e achei umas blusas boas por preços, digamos, possíveis. Como sempre faço nesses casos, comprei várias do mesmo modelo, de cores diferentes.
Queria ter comprado sapatos e calças também, mas aí já era demais. Quase dez da noite, no xóps cênts, too much. Sem falar que sapato é ultra difícil para mim. Porque não abro mão de conforto, mas não quero andar só de tênis. Nem convém, lá onde trabalho. (Só na sexta-feira, que é Friday Casual e todo mundo vai mais relax.) E nossa, como é difícil encontrar sapatos arrumadinhos e confortáveis. E vejo as mulheres andando para cima e para baixo com uns scarpins inacreditáveis, com umas sandálias medonhas, de salto fino bem alto e só uma tirinha passando entre o dedão e o segundo dedo, de modos que em 95% dos casos fica saindo pé pra fora da sandália, o mindinho ali meio torto, caindo, encostando no chão. Ou com sandálias de salto alto e tiras amarrando na canela, moda gladiador! O horror, o horror.
Não que eu preferisse ser homem, nesse aspecto. Acho bacana poder variar tanto. Não sou uma só, já diria a querida. Mas é bizarro constatar a dificuldade em encontrar coisas ao mesmo tempo medianamente formais (não trabalho de tailler, nem de jeans e camiseta) e que não sejam apertadas, desfavoráveis e, pelamordedeus, que não tenham babados! (O senso de humor dessa gente da moda parece não ter limite.)

7.8.09

Histórias do happy hour


Então M. conta que, ano passado, foi a uma festa de pré-reveillon. E lá prometeu que, se "beijasse na boca" naquele dia, jogaria flores para Iemanjá no reveillon. Dito e feito. "Naquela festa ninguém mais beijou na boca, entre minhas amigas. Só eu!". Viu que coisa funcionava. Arriscou: se alguém a pedisse em namoro ainda naquele ano, mandaria uma barco para Iemanjá. Pois alguém foi lá e pediu. A verdade é que ela não aceitou o pedido do namoro. Mas como a promessa era essa, viu-se obrigada a pagar.
"Fui na casa de macumba e pedi o barquinho mais discreto que havia. 'Se tiver uma canoa, moça, melhor ainda'. Não tinha, claro. A vendedora me falou: 'Se está querendo arranjar marido, melhor levar um barco grande'. Comprei, é claro, né. E quando me perguntaram o que eu ia colocar no barco, fiquei surpresa: 'Ué, ainda tem que colocar coisa dentro?!'. Então na própria loja descobri que tinha um 'kit', um 'kit Iemanjá', vê se pode. Menina, você não imagina a vergonha que eu senti no dia do reveillon, dentro do ônibus, carregando aquele barco! Coloquei num saco plástico, é claro, mas ó, que vergonha. E na hora, na praia, cadê a coragem de levar o barco pro mar? Todo mundo tinha me dito que era comum, que no dia ia ter uma porção de gente jogando barco pra Iemanjá, mas cadê? Ninguém! Acabou que não tive coragem, pedi para alguém levar o barco para a beira d'água para mim, de tanta vergonha."
-- Não brinca?!
"Pois é. Resultado taí, este ano. Maior secura!"
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