21.4.13

London calling

Voltei de Londres encantada com a cidade. A cada visita cresce a minha simpatia e admiração por este lugar fascinante. É tão grande e diversa, tão naturalmente multicultural, tão organizada mas não de uma forma autoritária como os germânicos, tão cultural mas não blasé como os franceses, tão cheia de encantos e novidades.


Fui a uma exposição do Man Ray na National Portrait Gallery, que foi bem melhor do que eu esperava. Afinal, este foi o Plano B, pois pretendíamos ir ver a mostra do Lichtenstein na Tate Modern, mas os ingressos estavam esgotados (quer dizer, os ingressos não esgotam exatamente, apenas para aquele horários -- só vendem para você entrar a partir de uma certa hora, que não era conveniente para mim). E o Man Ray, que eu conhecia como participante do grupo dos surrealistas, amigo do Duchamp e autor de fotos famosas como a de Kiki de Montparnasse/violino (Le violon d'Ingres, acima), é na verdade autor de muitas outras fotos célebres que eu não sabia serem dele.


O cara realmente conheceu todo mundo naqueles anos 20-30. Picasso, Coco Chanel, Stravinsky, Schönberg, Le Corbusier, Antonin Artaud, Virginia Woolf, James Joyce, Aldous Huxley e outros. Além disso, ele fez diversas experiências com efeitos e montagens fotográficas, experiências essas que de fato significam algo a mais do que o mero experimentalismo. Uma excelente surpresa, essa exposição.


E na minha última noite na cidade, fui a um circo. Isso mesmo, circo. Mas um circo contemporâneo, bem moderno e com toques teatrais. Foi simplesmente bárbaro, nunca vi nada assim antes. O espetáculo se chama Bianco, e a companhia é a Nofit State Circus, do País de Gales.


Tem trapézio, malabaristas, corda bamba, contorcionistas e tudo o mais, mas é tão não-tradicional que causa um impacto enorme. Tinha gente de todas as idades assistindo.


 Eu me emocionei e me senti como uma criança, aplaudindo boaquiaberta. Vejam a foto acima, isso é um vestido! A plateia fica em pé durante todo o tempo (mais de 2 horas, com intervalo), se movimentando e andando de acordo com a disposição dos imensos módulos, que muda a cada número.




O bacana é que toda essa agitação cultural -- exposições diversas, circo contemporâneo e muito mais -- não fazem parte da programação "hipster" e moderninha da cidade, ou pelo menos assim me pareceu. É parte do dia-a-dia, assim como um cinema ou jantar.

Às vezes me policio para não ficar parecendo pernóstica, olha-só-como-sou-cool, falando que fui a Londres, vi Man Ray etc. Mas não, isso não pode parecer afetação, tem que fazer parte do nosso cotidiano, para o nosso próprio bem.

14.4.13

Thatcher e as mulheres no poder

Estou em Londres - afinal, não poderia deixar de perder, in loco, o funeral de Margaret Thatcher!
As muitas reportagens sobre a morte dela trouxeram à tona uma porção de lembranças da minha infância. De assistir ao Jornal Nacional à noite e ver o Cid Moreira falando de vários assuntos marcantes dos anos 80, como "A Guerra Irã-Iraque", "A Seca no Nordeste" e, claro, "A Guerra das Malvinas".
Não apenas no contexto das Malvinas, mas durante todo o tempo em que ela esteve no poder, eu me habituei a ouvir a expressão "a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher", que para mim era uma variação de "o presidente americano Ronald Reagan" ou "o presidente francês François Miterrand". E de alguma forma inconsciente, eu passei a achar normal que uma mulher - não apenas uma mulher, mas uma senhorinha que muito se parecia com a minha avó - fosse chefe de estado.
Aqui na Inglaterra só encontro gente que a detestava e quer mais que ela apodreça no inferno. Há também muitas críticas a respeito dos custos milionários do funeral. Mesmo sem conhecer o assunto a fundo, tendo a me colocar ao lado dos que acham que seus onze anos de governo tiveram mais malefícios do que benefícios. Ao mesmo tempo, fico grata a ela por ter inculcado na criança que eu fui a noção de que uma mulher podia chegar ao topo do poder.
*
Claro que vim para Londres por outro motivo (a London Book Fair, que começa segunda). Pude passear no fim de semana, e andei bastante de ônibus. Confesso que tenho vontade de chorar de emoção quando chego no ponto e vejo um letreiro eletrônico dizendo o número e destino dos próximos 3 ônibus que vão parar naquele ponto, e em quantos minutos eles estarão ali. E funciona perfeitamente. As pessoas daqui não entendem muito bem por que não ando mais de taxi, já que posso apresentar o recibo e a empresa paga. Eu respondo que, enquanto entusiasta do transporte público, considero um prazer andar de ônibus e metrô em Londres, mas ninguém parece entender muito bem.

10.4.13

Futebolistas

A caminho de uma pelada

4.4.13

Emocionante



Vergonha, culpa, vulnerabilidade. Temas sobre os quais ninguém quer falar -- e quanto menos se fala, mais fortes esses sentimentos se tornam.
É fascinante o que esta mulher consegue fazer, quanta verdade consegue transmitir em vinte minutos, que é a duração deste vídeo. Vale a pena reservar um tempinho em que você não esteja multitasking loucamente para assistir com atenção.
Eu li o livro dela e me emocionei. E se emocionar com esse tipo de não-ficção... é raro, raríssimo.
Enfim. Minha contribuição de hoje para um mundo melhor.

1.4.13

O Coletivo de Mães -- ou Por que tantas mulheres são tão chatas?


Viajamos no feriado da Páscoa, fomos a um hotel-fazenda não muito longe do Rio.
Minhas amigas zombam de mim porque eu vivo indo a hotel-fazenda com as crianças, mas é verdade que acho um ótimo programa, e principalmente me lembro de adorar essas viagens quando eu era criança. Andar a cavalo, dar comida a galinhas, tomar banho no lago, correr pela grama, ver formiga, minhoca, borboleta e lagarta. Acho bom.
Como era um feriado prolongado, o lugar estava lotado de famílias. Oportunidade perfeita para o surgimento do Coletivo de Mães, uma associação quase imediata que se forma quando as crianças começam a brincar juntas e as mulheres perdem a capacidade de encontrar mais o que fazer além de ficar, digamos, confraternizando com outras mulheres, celebrando o exercício da maternidade, ou coisa que o valha. Pracinhas e pátios de creches na hora da saída das crianças são outras habitats naturais do Coletivo.
Via de regra, é insuportável.
Porque é assim: fala-se apenas sobre criança, marido e criadagem. Não necessariamente nessa ordem. E o tom que impera é o que chamo de "competição de martírio". As mães estão sempre reclamando ou se vangloriando do sacrifício que fazem em nome do tal exercício da maternidade. O filho já pode ter 9 anos de idade, mas a mãe-mártir está ali para te contar que dos zero aos dois anos aquela criança não dormiu mais de quatro horas seguidas, ou que tem alergia a quase tudo, além de intolerância a lactose, fotofobia ou transtorno de déficit de atenção. Se uma diz que os dentes de sua criança estão nascendo e incomodando, a mãe ao lado se apressa em contar como os dentes do filho dela nasceram tão mais cedo que foi uma dificuldade ainda maior. Gostam ainda de brandir aos quatro ventos o quão chatinho o filho é para comer, e como isso exige dela tantas peripécias, idas ao pediatra e complementos alimentares caros. Ao que outra vai responder com alguma coisa ainda mais fantástica, como Meu filho não gosta de beber água, ou sei lá mais o quê. Há sempre também uma história sobre uma doença rara, operação de emergência numa localidade remota, ou picada de bicho peçonhento. E fatalmente, o desfecho sacrificado, mas com final feliz.
A mãe/mulher-mártir pode ter te conhecido há menos de dez minutos, mas não hesita em contar que o marido nunca lembra de pegar as coisas, ou é incapaz de saber onde guardar pomada, chapéu, par de meias extra, protetor solar, descongestionante nasal ou repelente. Gosta também de deixar todo mundo a par que foi ela quem fez as reservas para o hotel, porque esses maridos jamais sabem fazer esse tipo de coisa -- se fizerem, claro que fazem do jeito errado. Esses horríveis pais tampouco acordam à noite quando os filhos choram, vão ao pediatra ou às reuniões da escola -- a menos que seja para falar alguma bobagem ou comentário fora de lugar.
E nessa ladainha o tempo passa, com esses discursos de superação de dificuldades inventadas se autovalidando reciprocamente, numa mistura de grupo de apoio e redenção pela identificação. No fundo ninguém se escuta, apenas registra-se brevemente o assunto para logo em seguida contrapor seu próprio e mais extremo exemplo.
Pode-se dizer, claro, que essa não é minha turma e que preciso frequentar lugares e pessoas com quem possa desenvolver afinidade. É um ponto válido. O que me intriga, sinceramente, é o compartilhamento desse tipo de informação com quem nem se conhece. É a assunção de que os pormenores da saúde e desenvolvimento do seu rebento vão interessar a qualquer um. O que aconteceu com falar mal do governo e comentar sobre filmes e livros? Não sei não. Tudo isso me parece amostra de um egocentrismo exacerbado e inconsciente, que naturalmente se reflete na forma de ser dessas crianças.
Dito isto, registre-se que a viagem foi ótima.