25.3.11

Todos querem ruibarbo

Entra semana, sai semana, entra mês, sai mês, e não muda.
A busca no Google que mais traz gente para este blogue é "ruibarbo" - a palavra e a imagem.
Por causa deste post aqui.
Ruibarbo ganha de lavada, mas fico feliz que entre as expressões top 5 que direcionam para cá estejam "Dicionário analógico da língua portuguesa" e "Vitória de Samotrácia".
Muito melhor do que "assistente de mágico" e "trago a pessoa amada em 3 dias", que já foram campeãs de audiência.

(Pronto: é agora que isso aqui vai bombar de tanto acesso! Haha.)

24.3.11

Questão de suma importância

E todo dia pela manhã me vem esse pensamento.

Por que no café da manhã comemos as frutas antes dos salgados (pães, torradas, queijo), enquanto nas demais refeições as frutas recaem na categoria de sobremesa, e portanto são consumidas depois da comida salgada?

22.3.11

Terríveis três

Os americanos têm a expressão terrible twos para denominar o período difícil ("terrível") que é o segundo ano de vida de criança, quando ela começa a falar, argumentar e dar os mais espetaculares chiliques.
Mas francamente, acho que escolheram terrible twos só por causa da aliteração em inglês (poderia ser terrible threes também, mas quem consegue pronunciar isso? Americano é tudo preguiçoso). Os dois anos são uma moleza perto do que estão sendo os três. Que, aliás, é a aliteração em língua portuguesa.
Então fica instituída a fase dos terríveis três, quando tudo vira um drama, a argumentação se sofistica e as estratégias das crianças ficam realmente terríveis.
Porque, juro, ficar três horas dando esporro é uma canseira.

21.3.11

Viva a sociedade alternativa

Mathilde, no Jardim I, agora tem atividades na creche que incluem a leitura de livros em sala de aula e em casa. Então toda sexta-feira ela virá da aula com livros que devem ser lidos em casa, com os pais, e devolvidos na segunda. Para montar o acervo, a escola pediu que comprássemos dois livros infantis: Fogo no céu e Ninoca vai brincar no parque.

Preço na Livraria Cultura online:
Fogo no céu - R$21,90
Ninoca - R$49,90
Frete econômico - R$7,00
(Prazo médio: 6 A 12 DIAS ÚTEIS  APÓS disponibilidade do produto em estoque)
Total: R$78,80

Na Estante Virtual:
Ninoca - R$10,00
Frete - R$5,05

No Trocando Livros:
Fogo no céu - R$0,00
Frete - R$0,00 R$4,50 (aprox.)

Total gasto: R$15,05 R$19,55

Fogo no céu chegou hoje. Ninoca foi postado quinta à tarde por um sebo de BH, deve chegar até amanhã.

E mais não preciso dizer.

Update: a leitora Sharon apontou, com muita propriedade, que para conseguir que te enviem um livro no Trocando Livros, é preciso ter um crédito no sistema do site. Ganha-se um crédito ao enviar um livro a alguém, e quem envia arca com o custo do frete. Coloquei R$4,50, que é mais ou menos o preço do envio de um livro de 250 páginas pela modalidade Impresso Registro Módico.

Update 2: Ninoca já chegou.

17.3.11

Em perspectiva

Uma das consequências que uma catástrofe como essa que acontece agora no Japão tem no dia-a-dia de uma pessoa comum que mora do outro lado do mundo, como eu, é uma violenta enquadrada na perspectiva dos problemas que se tem.
Por exemplo, estou no meio de um tratamento dentário. Canal. Coisa pra lá de desagradável. Aliás, é (mais) uma daquelas coisas da maternidade sobre as quais ninguém me preveniu. Isso mesmo. A gravidez pode ser bem cruel com seus dentes, coisa aí de cálcio que vai para o bebê, sei lá os detalhes, os leitores endodentistas que esclareçam. Este é meu segundo canal, o canal do Oliver (o primeiro foi meses depois do nascimento de Mathilde). De modos que. Só vou fechar o canal na semana que vem. Meu dente fica latejando, latejando, e mal consigo comer coisas sólidas. Mas é um latejar que não chega a ser dor, é só um incômodo chato o suficiente para que eu não consiga dormir e fique mais de 4 horas rolando na cama.
E aí, quando finalmente entro naquele estágio de semiconsciência que precede o sono, vem um mosquito zumbir no meu ouvido. Porque a mosquitada está solta aqui na vizinhança. E já são não sei quantos bairros com surto de dengue, e eu nunca mais vi o carro do fumacê na rua. Aqui em casa só dá Aedes. A gente mata os poucos que consegue com a raquete elétrica, olha de pertinho e vê aquelas perninhas rajadinhas da família Egypti. Uma tristeza.
Pra completar, as crianças se revezam na madrugada. Quando uma dorme, o outro acorda pra mamar. Quando esse dorme, a outra tem um pesadelo. Quando essa dorme, o outro acorda de novo e fica com aquela cara de "vamos brincar!". Quando você consegue dopá-lo com mais leitinho materno, a outra quer ir dormir na sua cama. Et caetera.
Mas aí que está. Mesmo me sentindo insone, cansada e dolorida, com que cara vou reclamar da vida enquanto do lado de lá do planeta as pessoas estão tendo que se virar com a trinca terremoto-tsunami-acidente nuclear? Nem é tanto pelas pessoas desabrigadas, que isso é uma tragédia, claro, mas há dois meses aqui do lado, no interior do estado, um monte de gente também ficou desabrigada, foi soterrada e tal. E em cidades que eu conheço e gosto muito, como Teresópolis e Friburgo, ao passo que nunca estive no Japão. Mas o lance da energia atômica é que pega e faz com que meu coração esteja lá com os japoneses. Esse é o detalhe desnecessário nessa tragédia, o toque que nem o mais doente dos roteiristas de filme-catástrofe pôde jamais imaginar.

(Um beijo especial pra N., minha amiga querida e leitora deste blogue, que é brasileira mas que um dia já foi japonesa.)

15.3.11

Livros e seus leitores

Livros de Diana e Rodrigo, México
Como já escrevi aqui antes, fiz no ano passado um cadastro de leitor-vendedor no portal de sebos Estante Virtual, por meio do qual posso cadastrar até 100 livros para vender no site, sem precisar pagar nada por isso (a menos que eu venda mais de R$200 por mês, quando então tenho de pagar 5% de comissão, o que acho muito razoável). Minha primeira venda aconteceu em maio de 2010, e de lá para cá vendi 30 livros através da Estante Virtual. Somando esses com uma meia dúzia que vendi para os leitores do blogue, e mais uns 15 que mandei por meio do site Trocando Livros (e recebi outros tantos de volta, como Órfãos do Eldorado, do Milton Hatoum, quatro livros do Garcia-Roza, um livro sobre investimentos que despertou minha curiosidade, a biografia de Machado de Assis, o badalado livro da Tatiana Levi, A chave da casa, que li achando que não ia gostar mas acabei gostando bastante, e principalmente, o exemplar em inglês de Os Pilares da Terra, livro que, como vocês já sabem, passei a disseminar com o fervor dos missionários), já são uns 50 livros de que me desfiz nos últimos dez meses.

Livros do Mohammed, Malásia

Até aí nada de mais. Qualquer um pode se desfazer de muito mais de 50 livros em um único dia, vendendo para um sebo, doando para uma biblioteca ou coisa que o valha.

Mas o que me deixa especialmente satisfeita é saber que esses livros, que estavam apenas acumulando poeira e ocupando espaço na minha casa há vários anos, estão agora nas mãos de pessoas que realmente os querem, a ponto de se darem o trabalho de comprá-los -- ou seja, entrar em contato comigo, pegar o número da minha conta, depositar a quantia acertada, aguardar pacientemente pela entrega do correio.

Livros da Dagmara, Polônia
Está sendo curioso perceber como alguns livros comprados na época da faculdade de comunicação se tornaram raros e portanto valiosos. Tiragens pequenas feitas por editoras idem. Livros que não devem ter custado muito mais de R$15 ou R$20 há dez anos e que vendi por mais de R$50, sendo o mais incrível de todos o caso de Ética, do Alain Badiou, 100 míseras páginas já um pouco amareladas que saíram a R$65 + frete para um leitor de Campinas. Ah, a gloriosa lei da oferta e procura.

Livros da Cathe, Estados Unidos

Mas o mais interessante é ver o destino que meus livros estão encontrando. É uma espécie de retrato 3x4 da carência de livrarias e bibliotecas no Brasil. Livros muito fáceis de achar, clássicos como Quarup de Antonio Callado ou O Senhor das Moscas, de William Golding, livros que vendi por ter duas edições diferentes, foram parar no interior da Bahia e em Nilópolis. Um Baudrillard que não me interessa mais seguiu para Blumenau, e um suspeito livro sobre sapateado foi-se embora para Florianópolis. Uma antologia de poesia africana em língua portuguesa foi parar em Santa Cruz, um dos bairros mais populosos da Zona Oeste do Rio, e que eu me pergunto quantas livrarias terá, se é que tem alguma. Para o interior do Amazonas seguiu um livro ultra específico, sobre Walter Benjamin (era tão no meio do Amazonas que o correio demorou quase um mês para entregar). E para Maceió foi um exemplar de contos de um autor alagoano, editado e impresso em Alagoas, mas que teve que passar por Botafogo para encontrar um leitor conterrâneo.  O litoral paulista também comparece. Para Santos foi o livro sobre o pensamento de esquerda nos EUA no século XX, e para o Guarujá um livrinho (bem ruizinho, diga-se) sobre jornalismo cultural, daqueles que a gente compra no início da faculdade, pura empolgação. De BH apareceu alguém interessado em Hannah Arendt escrevendo sobre a política em Kant (e por que eu um dia comprei este livro, que aliás nunca li, permanece um ponto obscuro em minha biografia). Partiram daqui também um ou outro exemplar daquela famosa coleção Debates, da editora Perspectiva, vários livros sobre cinema que eu jamais leria novamente (inclusive um em francês), livros sobre Nietzsche, um volume certamente datado sobre "as tecnologias do virtual" publicado em 1993, e, para minha surpresa, a edição original de um romance americano lançado no Brasil há uns 10 anos foi parar nas mãos de um empolgado leitor anglófono em Teresina.

Livros da Anna, Grécia
O desapego dos meus livros foi uma das melhores coisas que me aconteceram depois da última arrumação cum reforma que fizemos aqui em casa*. Passei a valorizar muito o espaço disponível, e vi que muitos livros, definitivamente, não estavam fazendo jus ao espaço que ocupavam. Crescemos acostumados à noção de que uma grande (no sentido de extensa) biblioteca é uma coisa importante. Basicamente porque, ao longo dos séculos, ter uma grande biblioteca possibilitava encontrar uma enorme gama de informações, quando necessário. Nem preciso dizer que essa utilidade, pelo menos num nível cotidiano, doméstico e generalista, é amplamente suprida hoje em dia pela internet. Então a biblioteca pessoal passou a ser, pelo menos para mim, a coleção dos meus livros do coração, aqueles pelos quais nutro um sentimento, aqueles que me dizem ou me disseram algo de importante, aqueles aos quais quero voltar muitas e muitas vezes. Ou ainda, aqueles que ainda não li, mas dos quais tenho grandes esperanças de bons momentos futuros.

Livros do Gert, Holanda

Que não pareça que não tenho apreço pelas bibliotecas institucionais e públicas. Muito pelo contrário. Como acho que já disse aqui antes, muitos dos livros que tenho e que não quero mais nem deveriam ter sido comprados por mim, em primeiro lugar, pois foram meros frutos de curiosidade que não tiveram um final feliz. Num mundo ideal, eu teria pego esses livros numa biblioteca e visto se me apeteciam ou não. Por isso sou grande entusiasta das bibliotecas públicas, e acho que esses espaços são capazes de fazer uma diferença fundamental na formação de qualquer leitor -- melhor dizendo, de qualquer ser humano.

Livros da Maggie, Estados Unidos
Mas na micro-esfera, poder dar um destino mais feliz e mais justo a esses livros que estavam desprezados por mim me enche de satisfação, e recomendo a todos que façam o mesmo -- doem, vendam, troquem, mas saibam que é muito mais bacana fazer no varejo do que no atacado, mesmo com o trabalho que é dar número de conta, checar se o dinheiro caiu na conta, ir ao correio, informar o número do registro etc. No mais, continuem checando a lista de títulos disponíveis aqui ao lado, no Mini Sebo Terapia Zero**. Estou sempre atualizando e, para leitores do Rio, troco qualquer um deles por um bom papo regado com chopes e uma porção de batatas fritas.

*Outras melhorias dignas de menção foram o filtro-que-gela, que me fez beber muito mais água e abrir muito menos a geladeira, e a aquisição de um espetacular ultra-mega-blaster espremedor de suco de laranja ("extrator de suco", é como chamam os especialitas) que me fez beber muito mais suco de laranja, mas num nível profissional, tipo com espuminha de laranja, saca?
** Aliás e a propósito, descobri um site co-irmão, o MiniSebo da Lee. Já viram?
*** Todas as fotos retiradas do site Your Shelves!

11.3.11

Mad Men, a série anti-tatibitati



Não sou uma grande fã de séries de TV. Como sabem os que me leem desde os primódios, gosto de Seinfeld e de House (mas enjoei de ambos), e tive minha fase guilty pleasure com Brother & Sisters, que nada mais era do que uma novelinha americana, uma saudável dose semanal de drama familiar, que não me apetece mais.

Mas aí, minha prima ficou enchendo o meu ouvido sobre Mad Men, que eu tinha de ver, que era muito bom, que ela estava amando etc. Então gravou pra mim um DVD com as 3 primeiras temporadas baixadas. Foi tiro e queda. Viciei como nunca dantes.

Don Draper (Jon Hamm), protagonista e homem maravilhoso
Então, antes de tudo: Mad Men é uma série excepcional, como nunca havia visto. Roteiro, atores e direção de arte são incríveis, e os personagens são riquíssimos. Não posso deixar de recomendar a todas as pessoas inteligentes e de bom gosto (só!).

Passei o vírus para meu chefe e a gerente de marketing da editora, e agora faz parte da nossa rotina diária, um pequeno debate matinal sobre Mad Men. Porque a série tem essa característica dos bons filmes: provoca discussões.

Peggy Olson (Elisabeth Moss), career-girl e uma das personagens mais ricas da série
E por quê? Porque é uma série que dá margem. Dá espaço para o espectador pensar e tirar suas próprias conclusões. Uma série que não explica tudo, que não dá satisfações para cada escolha. Uma série anti-tatibitati. Para seres pensantes. Personagens ótimos e importantes somem de repente. Na vida como na arte. Decisões cruciais são tomadas e não são desenvolvidas no episódio seguinte. Você que se vire para dar conta de entender quais foram as consequências. E outras coisas do tipo. É muito bom.

Outro dia vieram aqui em casa à noite essa minha prima e seu marido, e ficamos tanto tempo debatendo "a existência segundo Mad Men", que meu pobre marido, que nunca assistiu nenhum episódio, se transformou num pária social.

Pete Campbell (Vincent Kartheiser), gerente de contas e almofadinha inescrupuloso

O enredo: Mad Men se passa entre 1959 e 1965, tendo como personagem principal Don Draper, diretor de criação de uma grande agência de publicidade de Nova York. A partir daí, temos dois principais núcleos: a vida privada e a vida profissional de Don.


Na vida profissional, há o dia-a-dia da agência, os primórdios da publicidade para TV, a luta para conquistar novas contas, as relações de trabalho incrivelmente diferentes dos anos 60 pra cá, o ambiente de extrema competição dentro da empresa (entre secretárias, entre redatores, entre gerentes de contas, entre diretores, e entre todos esses ao mesmo tempo), lealdades adquiridas e traídas, e o desenvolvimento de carreiras numa época em que o trabalho na área de publicidade ainda não era bem compreendido.


Betty Draper (January Jones), esposa entediada e dublê de Grace Kelly
Na vida privada, as relações domésticas de Don com sua esposa e filhos, os casos extraconjugais, o tédio da vida doméstica da mulher americana rica que não trabalha, as questões de consumo (carros, TVs, eletrodomésticos). E o impacto de grandes acontecimentos, como a morte de Marilyn Monroe, a crise da Baía dos Porcos, o assassinato de Kennedy, o início da guerra no Vietnã, os primórdios do movimento hippie.

Joan (Christina Hendricks), chefe das secretárias da agência e musa dos figurinistas
Permeando tudo isso, e tornando muito mais interessante, o retrato de uma época em que o psicologismo e o politicamente correto ainda não dominavam a cena. É difícil não se escandalizar quando Don liga para o analista de sua mulher para saber do que ela anda falando nas sessões de análise (e o analista conta com a maior naturalidade, afinal é o marido quem paga o tratamento). Ou não se chocar com a forma sutil como um elefante como os pais tratam as crianças. E, beirando o caricato, o cigarro e a bebida. Algum maluco já deve ter estimado quantos cigarros, em média, são fumados por episódio. É uma espécie de marca registrada da série. Porque todos os personagens fumam o tempo todo. Na sala de reunião, no elevador, dentro do consultório (o médico fuma), enquanto prepara o jantar, as mulheres grávidas. É tanto cigarro, que atualmente, na quarta temporada, já me acostumei. A bebida é outra constante. No escritório, chegando em casa, no bar da esquina, é um drink atrás do outro.

A verdade é que não consigo descrever a série com o entusiasmo necessário. O que posso dizer é: usem seu tempo livre para ver essa história. Passa na HBO, mas eu vi tudo no computador, baixando os episódios legendados (legendas cheias de problemas, mas quebram um ótimo galho) neste site. Foi, aliás, a primeira vez que tive a pachorra de baixar qualquer coisa audiovisual para o meu computador. Para vocês verem meu grau de comprometimento. (Mas tem sites -- não sei quais -- que oferecem streaming, sem precisar baixar.)

O figurino é um espetáculo à parte
Até o momento, Mad Men tem quatro temporadas de 13 episódios cada. Li por aí que a quinta ainda nem foi gravada, sofre com problemas de negociação. Crises de abstinência à vista.

9.3.11

Ônibus monocromáticos (Da série: Cartas para o jornal)

Um dia, quando eu tiver muito tempo livre, vou me dedicar a escrever cartas para o jornal. Sou daquelas que leem a seção de cartas dos jornais. E observo que alguns missivistas são assíduos. Já sei identificar quais os assuntos caros a cada um, e como se posicionam em relação a temas cotidianos. No fundo, nutro uma profunda admiração por aqueles que dedicam parte do seu dia a escrever para o jornal dizendo que isto ou aquilo é um absurdo.

Ainda não cheguei ao estágio de escrever cartas para o jornal, mas tenho um blogue. E aqui posso dizer, sem medo de ser cortada pelo editor da seção de cartas: é um absurdo o que estão fazendo com as cores dos ônibus cariocas!

(Disclaimer: Desculpem os que não são do Rio, mas já dizia, com propriedade, meu amigo H., carioca que há muito mora fora: discutir linhas de ônibus é o cúmulo da saudade. E é verdade, o carioca de classe média costuma ter uma relação estreita com o sistema rodoviário que cruza a cidade. O ônibus ainda é, de longe, o principal meio de transporte coletivo do carioca.)

Para quem não está entendendo nada: a prefeitura resolveu uniformizar a pintura dos ônibus da cidade. Agora estão todos ficando iguais, brancos com detalhes em cinza.

438 e 157 - vermelhinhos clássicos desbravando o Centro para cortar a cidade de Norte a Sul

A questão é que, há décadas, os ônibus do Rio eram caracterizados pela cor de sua (imensa) carroceria. E o mais incrível é que as cores, bem como os números das linhas, costumavam ter sua lógica.

Dentro do caos que é o serviço de ônibus do Rio, com um óbvio excesso de coletivos vazios circulando e atravancando o trânsito, o sistema das cores era uma das poucas coisas boas. Pelo simples motivo de que, parado no ponto de ônibus, atrás de cinco dúzias pessoas olhando na mesma direção, era possível discernir, lá de longe, se é o seu ônibus que está vindo ou não. E isso faz toda a diferença. Só não sabe disso quem não anda de ônibus, que são justamente as pessoas que tomam essas decisões.

572 Glória-Leblon: Figurinha fácil na Zona Sul, mudou de número e perdeu o bege característico


Quem, senhores, nesta cidade, nunca andou de 433, 432, 438? Assim como todas as linhas iniciadas por 4, estes fazem a ligação Zona Norte-Zona Sul. E são (eram) todos de um vermelho inconfundível. O 157, Central-Leblon, único que margeia a Lagoa Rodrigo de Freitas no sentido Botafogo-Leblon, também sempre foi vermelho. O 410 (Tijuca-Gávea) e 409 (Tijuca-Horto) eram azulões na minha infância, mas há alguns anos viraram branco com azul. 434, 435 e 464 formavam a trinca laranja. Os verdes, começados com 6, fazem o circuito Zona Norte-Centro.

179 - Central-Alvorada: garantia de uma viagem de muitas horas...

Pela Zona Sul, abundam os circulares: todos beges e começados por 5: 571 e 572 (Glória-Leblon), 583 e 584 (Cosme Velho-Leblon), 569 e 570 (Largo do Machado-Leblon), 511 e 512 (Urca-Leblon). Sempre aos pares porque um é via Botafogo, e outro é via Copacabana. Crime dos crimes, estão mudando também os números!!! Outro dia via um ônibus 161 circulando, e não entendi nada: esta linha não existe, pensei. Descobri que é o "antigo 571". Aaaaah!!! Estão destruindo a memória de uma cidade!

Para ir ao Maracanã, os prateados que pegam o Rebouças: 460 e 110. E os amarelos, Centro-Zona Sul todos eles: 127, 128, 132 (via Aterro), 158 (antigo 174, que mudou de número depois daquela tragédia), 178 (São Conrado), 179 (Barra).

606 - Verde mas nada ecológico, passa no Engenhão

Enfim, estou muito revoltada com isso. Como dizem meus colegas missivistas, é um absurdo.


2.3.11

Maldita

-- Porra, que música alta do cacete!
-- Será que vai ficar assim a noite toda?
-- E a escuridão? Não tô enxergando nada.
-- Vamos tomar uma cerveja.
-- Putz, quanta gente!
-- Credo, não vamos conseguir chegar no bar!

Esse foi meu diálogo com uma velha amiga ao entrarmos segunda-feira, por volta de meia-noite, na penúltima edição da festa Maldita. Depois de um bom tempo sem frequentar boates, eu demorei um pouco para me reacostumar àquele clima inferninho. Mas valeu a pena. A Maldita, que existe desde o final dos anos 1990, sempre foi a "nossa" festa, isto é, do meu grupo de amigos da faculdade. Criada e levada a cabo sempre por conhecidos, a Maldita manteve-se fiel ao seu inspirado slogan: "Comece a semana se acabando". Não é pra menos. Uma festa do mais puro indie-rock, sempre às segundas-feiras, começando às 23h30. É só para fortes. Se eu e meus contemporâneos éramos os habitués entre 1998 e, digamos, 2001, de lá para cá o público se renovou bastante, ficando sempre na faixa do pessoal de vinte e poucos anos, que pode se dar ao luxo de eliminar as manhãs de terça-feira de suas vidas.
A noite foi mesmo histórica. Todo mundo que não ia há tantos anos apareceu. Como escreveu um amigo num dos muitos emails trocados com as combinações de quem-vai-quem-não-vai, formou o "bonde dos sarcófagos". Lá pelas tantas a pista de dança lotou com a nossa turma, e eu até me emocionei. Parecia último capítulo de novela, quando todos os atores reaparecem numa grande festa -- inclusive aqueles cujos personagens morreram no decorrer da história. O clima era esse mesmo, até os fantasmas compareceram.
Eu me diverti horrores. Dancei muito (mesmo com a pista escura e o volume da música em níveis desumanos), abracei os amigos, cantei músicas há tempos adormecidas na memória (como Amigo Punk) e tive que sair à francesa na hora de embora, com medo de cair no choro se fosse me despedir de cada um.

OBS: A rigor, a última Maldita é na próxima segunda, mas como é no meio do carnaval, resolvemos antecipar a celebração em uma semana. Mas pra quem quiser ir, fica a dica: