31.8.06

Sobre bois e telhados


Era uma vez um músico francês chamado Darius Milhaud. Em 1917, ele veio para o Brasil em uma missão diplomática, como adido da Embaixada. Chegou no Rio de Janeiro, então capital da República, na semana do Carnaval, o que lhe causou funda impressão. Como era compositor, Milhaud ficou ligado na cena da música popular brasileira da época. Passou dois anos aqui. Voltou para a França, onde reencontrou sua tchurma, a típica folie da Paris dos Anos Loucos. Lá, compôs uma peça para orquestra chamada O Boi no Telhado (Le Beuf sur le toit), que cita mais de trinta músicas populares brasileiras de sucesso daquela época. É sua obra mais conhecida, e a estréia foi em 1920 como música de um balé, com argumento de Jean Cocteau. A peça é um verdadeiro quebra-cabeças de motivos brasileiros (tangos, choros, maxixes, polcas etc.) interligados, e entremeados por um motivo original de Milhaud. Entusiasta do politonalismo, Milhaud compôs O Boi com diversas passagens usando a técnica. Há também trechos em que duas melodias diferentes são tocadas simultaneamente por instrumentos da orquestra. O Boi tem várias gravações disponíveis, e alcançou um relativo sucesso no meio sinfônico, sempre visto como uma curiosidade, um olhar francês sobre a música dos trópicos.
Quase cem anos depois, musicólogos empreendem uma extensa pesquisa para identificar as músicas brasileiras usadas por Milhaud para a composição do Boi. Há referências óbvias (Apanhei-te Cavaquinho de Ernesto Nazareth, Corta-jaca de Chiquinha Gonzaga) e outras nem tanto (a música-título, de um tal Zé Boiadeiro). Algumas poucas permanecem não identificadas. Em seguida, músicos brasileiros pegam a peça de Milhaud para orquestra e adaptam para conjunto regional (flauta, clarinete, clarone, cavaquinho, bandolim, dois violões, percussão), buscando uma sonoridade mais próxima daquela que o francês ouviu nos anos 10 no Rio de Janeiro. Em seguida, fazem um concerto cuja primeira parte é com algumas das músicas originais (os choros, tangos, maxixes, polcas), e a segunda, com a transcrição da peça de Milhaud para regional.
Como diz a Mary W, "no planeta anna v." esse círculo que se fecha agora, com as músicas sendo tocadas como foram ouvidas por Milhaud (ou bem próximo), é uma notícia fantástica, digna de muita publicidade. É mais que uma curiosidade, é uma invenção misturada com retorno que só promove a excelência da nossa música, ontem e hoje.
Os talibãs da nossa cultura caem de pau no Milhaud, porque ele não deu crédito aos compositores brasileiros e não pagou direitos autorais. Agora me diz se isso não é perder completamente o foco da discussão, e passar para uma questão política e meio ressentida que é muito, muito menos importante do que a música.
Bom, enfim. No planeta Brasil, ninguém tomou muito conhecimento de nada disso. O grupo conseguiu, a muito custo, agendar 4 apresentações: 3 no Rio (no CCBB uns meses atrás, na Sala Baden Powell em Copacabana no sábado que passou, e no dia 14 de setembro na Finep, na Praia do Flamengo) e uma em (veja só!) Berlim, no fim de setembro, com apoio da embaixada brasileira.
E é nessas horas que eu acho que podíamos rebaixar o planeta Brasil a planeta-anão, junto de Plutão.

(Essa imagem aí em cima, assim como a história completíssima do Boi no Telhado, você encontra no ótimo site da Daniella Thompson.)

29.8.06

Da série E-mails Surreais #3

Episódio de hoje: Não existe piada de português -- é tudo verdade.

(...) Queria também dizer-lhe que enviei em correio registado uma cópia assinada do documento, mas sucedeu uma coisa inacreditável, era um envelope timbrado da minha Faculdade e os correios, por engano, mandaram a carta para a minha Faculdade em vez de a mandarem para o Brasil!!! A secretária do meu Departamento avisou-me do sucedido e já se procedeu à reexpedição. Espero que não demore muito a chegar.

28.8.06

Segunda-feira

Telefone toca às sete da manhã. Engano. Não trote. Engano mesmo. Acho que é domingo, que sacanagem, alguém me acordar a essa hora no domingo. Viro pro lado para dormir de novo. Lembro: hoje é segunda. Merda. Durmo mais um pouco. O despertador toca às sete e meia. Aperto o snooze. Toca de novo sete e trinta e cinco. Snooze. Sete e quarenta. Snooze. De cinco em cinco. Até as oito e meia. Quero repetir o snooze mais uma vez, como uma viciada em microcochilos. Mas tenho algum senso de ridículo. E de dever, ora essa. Fico com os olhos abertos: assim não durmo de novo. Lembro que sonhei com a minha motinha que vendi, uma scooter vermelha. Que tanto que eu gostava dela, de andar pelas ruas e subir pelas calçadas se precisasse. No sonho ela estava sem freios. Levanto, bebo água, vou até a sala. Deito no sofá mais um pouco. Que difícil levantar. Lá fora: nublado. Café, jornal, torrada com cottage. Ponho a mesma roupa de ontem à noite. O cabelo está tão descabelado que tenho até preguiça de olhar no espelho. Jogo uma agüinha em cima, dane-se. Na rua, um homem tira um papel de propaganda do pára-brisa do carro e joga no chão. Na banca de jornal, a manchete diz que o cantor de pagode sai da prisão cheio de amor pra dar. Quem se importa?
Trabalho. Bom-dia, bom-dia, bom-dia. Escada. Correspondências. Chegou o contrato do Rio Grande do Sul. O Sedex diz: para abrir puxe aqui. Mas não tem nada pra puxar. Corto com a tesoura. Computador. Ctrl+Alt+Del e digite seu login e senha. E-mails. Spams vários. Hi, Go a od news for you. P p HARMA b CY di k rec n tly from… Essas letras no meio das palavras são para fugir dos programas antispam, eu acho. Mensagem do überchefe reclamando de uma coisa qualquer, me perguntando algo impossível. Como vou saber? Ainda por cima escreve porque no lugar de por que. Tsc. Daqui de cima escuto a voz alta dele, na sala de reuniões do andar de baixo. Outro e-mail: o gerente gordo quer saber novidades sobre o assunto da Bahia. Mais mensagens: uma querida escreve porque quer fazer uma correção em alguma coisa. Respondo. Newsletter: É cedo ainda para cantar vitória, mas a economia Argentina está dando olé. Outra hora. Ligo ramal 162: Bom dia, acabou a água aqui em cima, podem vir trocar o galão? Obrigada. A funcionária nova: Bom dia, onde eu arquivo este documento? Liga o chefe, da sala de reunião. Pede para eu cobrar uma resposta da velhinha alemã que mora em São Paulo. Ligo pra ela com prazer, gosto tanto dela. Tem um jardim lindo cheio de orquídeas. Em São Paulo! Ficamos de papo no telefone. Ela diz que hoje está toda atrasada porque foi fazer exame de sangue. Só está tomando café agora, 10 da manhã. A secretária do chefe chega esbaforida na minha porta: Me deu um branco, como é o nome do marido da dona Fulana?! Peter, eu respondo. Ah, é. E volta correndo para a sala dela. Vem a senhorinha da tesouraria me visitar: Oi, pode me dar um help? (isso é ela sendo bem moderna, falando me dar um help). Claro, o que é? Preciso dos contratinhos da Elaine e do Curt. Eu adoro como ela fala das empresas como se fossem pessoas. E contratinhos, veja só. Pode deixar, te mando os pdfs por e-mail. Valeu! (isso é ela sendo moderna de novo, falando valeu!, ela que é evangélica e que me repreendeu gentilmente quando uma vez eu disse “mas esse banco é um inferno, hein?!”, que coisa, só porque eu falei inferno, mas mesmo assim eu gosto dela, pessoa do bem.)
Olho para meu quadro de cortiça. Papelzinho que meu pai de mandou na primeira semana do ano: Feliz 2006 pra você também! 185 da Independência 117 da República 118 da Lei Áurea 198 da chegada de D. João VI. Papai é super ligado em efemérides. Calendário: este mês, pintura de Edwin Harris (English, 1855-1906). Hoje: Bank Holiday (UK except Scotland). Mas não diz por quê. Ano que vem quero um calendário brasileiro, bolas.
Meio-dia.
Toca o telefone da mesa da estagiária, que só vem à tarde. Deve ser engano, ningué liga pra esse ramal. Sozinha na sala. Puxo a ligação. Musiquinha de chamada a cobrar. Desligo. Toca de novo. Tindin, dindindin, dindindin. Desligo. De novo. Deixo tocar. Não me aflijo com o telefone tocando, sou zen. E-mail pessoal. Bobagens. A conversa foi arquivada. Saiba mais. Desfazer.
Rua. Um garoto com uniforme de escola pública come um pacote gigante de fandangos. Cocô de cachorro na rua – alguém já pisou. Mil coisas a resolver antes de almoçar. Almoço. Quiche de queijo, salada. Como meia cebola crua. Ardido. Quase choro.
Trabalho. Sono. Café. Água. Presilhas para domar o cabelo. E-mails com aporrinhações. Vontade de responder: Prezado Fulano, obrigada pela sua mensagem. Vá à merda, sim? Cordialmente, etc etc. Mais mensagens. Convite para a abertura da exposição... E no fim: O emitente desta mensagem é responsável por seu conteúdo e endereçamento. Cabe ao destinatário cuidar quanto ao tratamento adequado. Etc. Em português, inglês e espanhol. Agora me diz: pra que isso tudo? Entra na sala um diretor da empresa, o mais velho – e mais figura: me ajuda, eu quero consertar uma cadeira que tenho na varanda de casa, a marca é Pride, mas eu procuro na internet e só encontro sites gays! E ele fala como se tivesse nojo, como se os gays-prides fossem pular do computador para tentar comê-lo – o que me deixa revoltada. Vai ver a sua cadeira é gay, respondo. Porra, vou jogar fora. Fueda-se então, homofóbico dos infernos. E não param de chegar e-mails. Detesto quando não sei se é homem ou mulher. Meu address book: Jyothi Chikkala. Alpha Wong. Per Kølle. Ua Matthiasdottir. Ua?! Uma mensagem volta: O endereço IP do seu servidor esta' cadastrado em alguma LISTA NEGRA (see SPAMCOP / NJABL / SPAMHAUSS). Lista negra, eu? É tudo tão estranho, e ninguém pára pra pensar.
Seis horas. Chega. Post besta, esse.

27.8.06

Direto do Soulseek


Sim, eu uso Soulseek para baixar músicas. Não me aventurei pelas maravilhas do Emule, nem dos bit torrents, que eu ainda tenho preguiça de ver como funcionam.
Mas enfim, das poucas coisas que me animo a procurar, descobri duas ótemas. Não tenho idéia se já são coisas super conhecidas que só eu nunca tinha ouvido. Tampouco sei se meus sete leitores estão atrás de novidades musicais. Não importa.
A primeira das coisas legais é o Mulatu Astatke, compositor e arranjador etíope que descobri graças à trilha sonora do filme Flores Partidas, do Jarmusch. É música instrumental, meio difícil de definir. Dizem que ele é um dos grandes nomes do EthioJazz, o que quer que isso venha a ser. Só sei que é uma delícia de ouvir. A começar pela faixa Yekermo Sew, que já serve para sentir o clima.
A outra coisa boa é mais engraçada. Chama-se Nouvelle Vague e é um grupo francês (aliás, grupo não: hoje em dia as pessoas se juntam para um "projeto", e o NV é um projeto, bien sûr) que mistura os dois gêneros musicais derivados do nome nouvelle vague: a bossa nova e o new wave. Pois é. Com uma descrição dessas, eu tive que procurar. E adorei. Comecei pela versão de Blue Monday, do New Order. Em bossa nova. Olha que engraçado. O espírito é esse, eles pegam sucessos do pós-punk e do new wave (Buzzcocks, Blondie, Bauhaus, Echo & The Bunnymen etc.) e fazem umas versões espertinhas, com violões e vozes miúdas, arranjos soft para as músicas punk. Hehe, ótimo para quem já passou dos 20 anos, mas ainda tem um pezinho (ainda que afetivo) no submundo dark dos anos 80.
Silviço:
www.nouvellesvagues.com
www.ethiojazz.com

26.8.06

Botonistas

Imagem: pca.org.br

A última: meu marido vai participar de um campeonato de futebol de botão. Haha, adorei!
Na última viagem a SP, semana passada, ele aproveitou para conhecer a fábrica caseira do cara que faz os botões, um metalúrgico que adaptou uma máquina para a confecção dos botões, e parece que o material é de excelente qualidade. O filho (que é na verdade o aficionado pelo esporte) faz as vendas pela internet. A esposa faz os "ônibus", capinhas de pano muito bem-feitinhas, para transportar o time, cada jogador em um bolsinho. Muito legal. Sabe aquelas iniciativas familiares que começam por acaso e dão certo? Ele ficou encantado.
Como na verdade esse campeonato não passa de mais um pretexto para uma boa farra, encontrar os amigos e beber cerveja, já estou providenciando uma bandeira para a torcida (composita essencialmente por mim). Lembrando ainda que, na última copa do mundo, quando já rolava um minitorneio, eu joguei uma partida, assim, de onda, e, inacreditavelmente, fiz um golaço.
(Minha teoria, que ninguém leva a sério, sobre o "futebol de mesa", é que os dois jogadores deveriam jogar ao mesmo tempo, disputando a bola lance a lance, e não essa coisa meio parada de cada um dar seus toquinhos de cada vez, que às vezes descamba para um jogo meio arrastado.)

Update: domingo: lá foi ele para a fundação oficial da Liga M a nguaça de Futebol de Mesa. Eu não disse que era só um pretexto?

25.8.06

A era das incertezas

Judas não foi um traidor.
Plutão não é mais um planeta.

Onde é que nós vamos parar?!

(E não vamos nem falar do PT, né?)

24.8.06

Nonada

O vaqueiro JGR. Imagem: eca.usp.br
Tá suuuper mal divulgado. Mas no site www.dominiopublico.gov.br, do Governo Federal, se você procurar bastante, tem o texto integral de Grande sertão: veredas disponível. Não dá para fazer download, nem para copiar, nem para procurar palavras (a menos que você seja um hacker, claro). Aliás, eu nem consegui aumentar o tamanho da fonte, e quase não deu pra ler de tão miúdo -- a legibilidade da fonte não é das mais camaradas. E são mais de 600 páginas, não sei quem é o cristão que vai conseguir ler tudo na tela.
Mas enfim, é uma iniciativa interessante. Observe que é por tempo limitado, em comemoração aos 50 anos do lançamento da primeira edição.
Eu sou favorável a essas iniciativas, e realmente acredito que isso aumenta as vendas do livro, mais do que diminui. Quem sabia, por exemplo, que existe uma edição de GSV à venda por R$ 28?

Pesquisa Terapia Zero

Você alguma vez já mandou seu chefe:
  • à merda?
  • pra putaquiuspariu?
  • tomar no cu?
  • se foder?
Conte como foi. Eu quero saber. Inspirações, idéias.

23.8.06

PS

Buscando imagens para o post de ontem, da Irmã Paula, mandei o Google Imagens procurar "freira", depois "nun". 90% eram fotos de sacanagem, freiras taradas, fantasias eróticas.
Mondo bizarro.

22.8.06

Irmã Paula ouve death metal

Foi essa imagem do disco do Sepultura, do post abaixo, que atraiu. Só pode ter sido. Como é possível explicar, de outra forma, que eu tenha ido parar na segunda-feira à noite num ensaio de death metal na Muda, sub-bairro da Tijuca?
Resumindo muito uma história longa, fui levar um adolescente norte-americano de 17 anos, filho de uma amiga da minha mãe, ao ensaio de uma banda de death metal da qual faz parte um amigo meu. Porque fiquei com dó do adolescente tendo que viajar com a mãe, tendo que fazer os programas dela, quando no fundo ele gosta mesmo é de metal.
Foi um momento Irmã Paula.
(Irmã Paula é um conceito muito usado na minha família, para quando alguém faz uma super-hiper-mega-ultra boa ação, sem receber nada em troca -- como sói, aliás, quando se trata de boas ações. A Irmã Paula, em si, eu nem sei bem quem foi. Diz o Google que foi uma das das fundadoras da ordem das Irmãs Missionárias do Precioso Sangue, nascida na Alemanha em 1865 e morta na Holanda em 1948.)
E depois dessa acho que posso ficar até o fim deste ano sem fazer nenhuma boa ação -- posso até mandar uns cegos em direção ao poste, ou largar umas velhinhas no meio da Av. Brasil, que mesmo assim ainda tenho crédito.
É, porque, sem contar o desprendimento de levá-lo ao ensaio, o lugar (um estúdio) era lá na Muda, estava chovendo e o trânsito um caos. E eu tendo que levar o jovem metaleiro de um lado a outro da cidade. E no caminho ele me explicava as diferenças entre heavy, death e black metal. E pra completar, o bar que eu conhecia, que fica ao lado do estúdio, onde eu pretendia ficar fazendo hora, lendo um livro, estava inexplicavelmente fechado.
Tudo isso engrandece um ser humano, sabe.
Expliquei ao jovem, no caminho de volta, o que é uma corrente do bem: que, ao longo da minha vida, fiz algumas viagens por países estrangeiros, e muitas pessoas que eu mal conhecia fizeram coisas muito legais por mim. Assim, sempre que posso, retribuo. E ele deve fazer o mesmo, quando tiver uma chance. Ele ficou um pouco impressionado. Mas me agradeceu muito efusivamente. E sumiu pela portaria do seu hotel no Leblon, levando o CD da banda do meu amigo, que ganhou de presente.

Imagem: http://gs92.sp.cs.cmu.edu/pictures/2004_07_26__eatme_annarbor/html/
img_3640_full.html

18.8.06

Roots, bloody roots


E mais uma vez tenho que me render e remeter a um post muy bueno do blogue da Ella (sorry, não tem permalink). Assim como Ella, eu também "me escondo um pouco, porque a exposição real me inibiria mais ainda". Uma maneira linda de dizer que ninguém que eu conheço sabe desse blogue aqui. Ninguém mesmo. Ainda não.
Seguindo: assim como Ella (esse é um trocadalho do carilho, putz), também eu tenho tantos amigos que moram em outras cidades e países. Essas pessoas que, e vou citar de novo, "transformam os laços em alguma coisa mais forte apesar da distância". É isso mesmo. Mas eu não consigo me imaginar emigrando -- assim, definitivamente. Já passei temporadas morando fora, mas sempre sabendo que dali a tanto tempo ia voltar para a minha cidade. Porque a coisa do pertencimento é muito forte por aqui. Isso de ser reconhecido. De ir a qualquer lugar e encontrar alguém, um amigo querido, ou um amigo de um amigo, ou um parente, ou qualquer um com quem role uma troca, uma identificação mútua. Essas raízes. Tão entranhadas. Que fazem a gente estranhar tanto a condição de estrangeiro. Porque tudo são essas raízes: as pessoas, as coisas, os climas, os cheiros, as ruas, as manias da cidade. São mesmo bloody roots.
Mas o que me balançou mesmo no texto dElla foi quando contou de uma amiga de infância que passou pela cidade dela, e parou para encontrá-la, dizendo "po, eu te amo tanto que eu tive medo de morrer e não te ver de novo". Nessa hora eu gelei. Porque eu fiz isso não tem nem dois meses. Quer dizer, não cheguei a viajar. Mas me deu a louca e eu liguei para uma amiga muito querida, de supetão, e disse isso: "se eu soubesse que você morreu e eu fiquei tanto tempo sem te ver e sem te dizer que te adoro, nunca me perdoaria. Não quero mais correr esse risco." E aí fomos ao cinema, e jantar, e colocar o papo dos últimos dez anos em dia, e a vida foi mais feliz.

PS: Esse título vocês sabem, né? Era uma música do Sepultura, que dava nome a um disco. E eu comprei uma vez um disco do Sepultura, não o Roots, mas o Arise. Num daqueles incríveis anos da adolescência que a gente não tem pudor de experimentar de tudo. O CD já se foi, num dos expurgos periódicos da discoteca doméstica. E se não me engano o Sepultura ainda existe, mas com outros integrantes. Nem sei se ainda são brasileiros. Mas eu seria uma idiota se tentasse fingir que não houve essa época da minha vida. Em que eu ouvia Sepultura. E coisas piores.

17.8.06

O maravilhoso mundo das bandas indie

Incríveis nomes de bandas:

What Made Milwaukee Famous
Suburban Kids With Biblical Names
I Love You But I've Chosen Darkness
Clap Your Hands Say Yeah (já virou mainstream, mas acho ótimo nome)

Essas crianças são tão criativas.

16.8.06

A infância nos tempos da abertura

Muito bom o post da Monix do Duas Fridas, sobre os filhotes da ditadura -- entre os quais me incluo, claro. Eu também lembro demais dos certificados da censura na TV, do JB ser o jornal do bem e O Globo, o jornal do mal, do programa A Semana do Presidente. Que trevas. Lembro de quando o Tancredo morreu, foi aquele bode nacional, e os adultos todos choravam muito. Então eu e meus primos fizemos uma letra alternativa para o Hino Nacional, assim querendo ser otimistas, sabe? Não lembro de tudo, mas lembro do trecho que entrava na parte "Se o penhor dessa igualdade/ conseguimos conquistar com braço forte", era assim: "Um senhor de setenta anos/ já não pode ter em mentes certos planos". Que horror, hein. E o que me marcava muito também era que eu sempre queria ter um cofre de porquinho para colocar moedas, que nem os personagens das histórias em quadrinhos da Mônica ou os sobrinhos do Mickey. Mas as moedas nunca valiam, porque a gente só tinha nota de 100.000, 500.000 etc. Aí cada vez que mudava o nome do dinheiro, apareciam de novo as moedas, e eu ia toda prosa começar a juntar. Mas poucos meses depois as moedas já não valiam nada e eu ficava tão frustrada. Pra vocês verem. A inflação tolheu meu espírito poupador.

Ui!


Não sei onde foi parar a minha [fiquei um tempão procurando na cabeça o substantivo para o adjetivo "destemido" e não achei. alguém? alguém? destemência, talvez?] do passado. Acho que agora estou demasiado sensível. Mulherzinha. Nunca tive problemas com filmes violentos. Muito menos livros. Agora não mais.
Outro dia passou Oldboy na televisão, me animei porque quis muito ver quando passou no cinema, mas não deu. Já na chamada para o filme aparecia uma cena em que o Oldboy arrancava o dente de um sujeito com um alicate. Assim, bem meigo. Mesmo assim comecei a ver o filme. Mas aí quando o cara começou a fazer nele mesmo uma tatuagem caseira, com uma tinta fajuta e agulha, urrando de dor, mudei de canal. E aí vez por outra zapeava de volta, pra tentar acompanhar um pouco a história. Enfim não deu, fiquei sem o Oldboy no meu currículo. Este fim de semana foi o Kill Bill 2. Porque eu gosto tanto do Tarantino. Que vi o Kill Bill 1 no cinema. E achei um porre. Tão cansativas, aquelas cenas todas de luta. Sem graça mesmo. Aí desisti de ver o 2. E todo mundo me disse que o 2 era o tal, que era muuuito melhor, que era quando a história fazia sentido. Aí liguei a TV e vi que estava passando. Bacana, vou ver. Mas aí começou uma seqüência de tanta porrada da Uma Thurman com a Kim Basinger, naquele clima ossos quebrados e olhos furados, que eu fui pra outro canal. Desencanei, como dizem os paulistas. Por acaso depois passei de novo pelo canal, e estava no fim do filme, bem na hora que tudo se explica. Que é um final calmo, vê que coisa. E pronto, entendi o filme. Kill Bill está no meu currículo.
Então. Depois do Bom dia camaradas minha empolgação literária africana aumentou e comecei a ler Feras de lugar nenhum, do nigeriano que foi pra Flip também (Uzodinma Iweala -- gente, que nome é esse?!). E não consegui passar da página 30. Porque já começa com uma criança (o narrador) virando soldado de uma guerra na África, num lugar não localizado, e tendo que matar um coitado que teve o azar de cruzar o caminho do bando de bárbaros que cooptou esse menino-narrador. Com um facão. Assim, é, partindo a cabeça do cara com um facão. E depois, meio em transe com todo o sangue que jorrava, retalhando o corpo do homem. Era o rito de iniciação do menino.
Aí pensei "ainda bem que não comprei este livro", e recoloquei na estante. Tenho sentimentos ambíguos quanto a isso. Não é que eu não queira saber que isso existe (não na África, mas aqui na minha esquina). Mas não tem cabimento eu me forçar a ler essas coisas como obras de ficção, se me fazem mal. Eu não preciso ficar culpada por não sentir nenhum prazer com uma leitura dessas. Ignorance is NOT a bliss, ok, leio os relatos, as reportagens, os relatórios, os livros de não-ficção, whatever. Mas a mão desse Iweala pesou demais.
(Bom, teve outras coisas também, o estilo não me agradou. Frases como "uma voz que corta o meu corpo como uma faca" (logo na página 1!), que me dão vontade de dizer "ah, puh-leeease")

Tua estrela solitária te conduz

Fala sério. Tem coisas que só acontecem com o Botafogo.

Após jogar na derrota do Botafogo por 3 a 1 para o Palmeiras no Maracanã pela 16ª rodada do Brasileirão, o goleiro titular Lopes sofreu um acidente nos vestiários do estádio.
Ao abrir a torneira para tomar banho, Lopes sofreu uma queimadura que deixou uma bolha em seu rosto. Segundo o atleta, a água estava fervendo.
Fonte: GloboEsporte.com

Tem que processar muito o Maracanã, né?

15.8.06

Res publica, a coisa pública


Visualize o prefeito da sua cidade aí no meio dessa muvuca. Foto: FolhaImagem
Adorei ler hoje no jornal, a propósito da notícia sobre o roubo do carro do Fred d'Orey na Linha Vermelha, um depoimento do Marcos Palmeira, que diz uma coisa que eu já penso há muito tempo, mas nunca tinha encontrado ninguém propondo essa mesma coisa: que os políticos só deveriam usar serviços públicos. A minha idéia (minha hmmmm, "proposta") na verdade é mais abrangente, e engloba todos os funcionários públicos. Ou seja: se o seu salário é pago com dinheiro público, seja municipal, estadual ou federal, você e seus filhos, netos, pais e avós só podem usar hospital público, seus filhos só podem estudar em escola pública, e você só pode ir e voltar do trabalho usando transporte público (pode ter carro, sim, mas só para os horários fora do expediente). Além disso, se tiver que entrar na justiça por algum motivo, só defensor público pra você. Porque o trabalho do servidor público é essencialmente zelar pela excelência do serviço público, não é? Então. Parece-me tão simples. Imagina só que legal seria.

Cadê o Ctrl+Z?

Enfurecida com o calor insano quando deveríamos estar no auge do inverno, com o dia péssimo que tive, com presenças inesperadas lá em casa, e com meu cabelo que nas últimas semanas resolver se rebelar contra mim, ontem peguei a tesoura, me tranquei no banheiro e cortei meu próprio cabelo.
No coments, please.

14.8.06

Xuínga

Parati, 2002
Para não dizer que não falei da FLIP, a sempre deliciosa festa literária de Parati, que muito lamentei perder este ano.
Acabei de ler Bom dia camaradas (assim mesmo, sem vírgula), do angolano Ondjaki, uma das atraçoes desta FLIP, que aos 28 já tem seis livros publicados e uma penca de prêmios. Uma delícia de leitura. Não é o livro pra se dizer "Vão correndo à livraria mais próxima e comprem djá!", mas flui que é uma beleza. Li num par de noites.
Na apresentação escrita pelo Luiz Ruffato, ele faz uma comparação que eu considerei bastante feliz com Os meninos da rua Paulo (que está aí à disposição em nova e caprichada edição da Cosac&Naify), para dizer que é um livro escrito para um público-alvo indefinido, que engloba inclusive os "jovens adultos". Porque o narrador é um garoto que vive em Luanda nos anos 80, sob o regime comunista. Não se sabe nem o nome nem a idade dele (provavelmente uns 11, 12 anos). E, sendo da elite (filho de ministro), o menino é um entusiasta do sistema, inclusive na maneira de chamar todo mundo de "camarada". Camarada professora, camarada diretora da escola, camarada presidente.
E a rotina do pequeno, que engloba soldados armados com "aká" a torto e a direito, cartões de alimentação para comprar comida, e professores cubanos hablando en español, é toda narrada naquele jeito tão engraçado que é o português de Angola, cheio de bué (=muito), matabichar (=tomar café da manhã), aldrabar (=mentir), e o melhor de todos: xuínga, corruptela de chewing gum.

A estranha família Angel

Fui ver o filme da Zuzu Angel, afinal. É um filme ok, mas, como todos os filmes brasileiros sobre episódios históricos, sem espaço para muita complexidade. Tem uns personagens que são super bons, antogonizando outros que são super maus. Sem maiores sutilezas. Pra ficar bem fácil tomar partido. Mas ok, sem entrar nesse mérito, vamos dar o crédito que o filme não estraga uma história que é muito boa -- a da Zuzu Angel em sua cruzada por justiça, uma história bonita mesmo. Não é piegas o filme, e isso é uma grande coisa numa história como essa.
Mas aí surge a questão Hildegard Angel. Assim: como foi que ela virou o que virou? Porque o irmão dela morreu como um idealista, alguém que decidiu "não fechar os olhos para a injustiça do mundo". Aí a morte bárbara dele fez a mãe pirar, e ela virou uma paladina da justiça, uma mãe desafiando a ditadura, tanto que deram cabo dela. O pai americano, que muito cedo se separou da mãe, foi morar no interior de Minas, onde abriu um orfanato. Bem. Aí, com um histórico desses, Hildezinha, irmã de Stuart, pirou também, mas para o lado oposto, e dedica sua vida ao... colunismo social! Há anos a vida dessa senhora se resume a tecer comentários e futricas sobre a vida alheia -- a vida de pessoas absolutamente fúteis, diga-se de passagem.
Stuart e Zuzu devem se revirar no túmulo.
Para ilustrar, seguem excertos da coluna de Hilde hoje no JB:
O buxixo em Mônaco é grande. Rumores dão conta que o príncipe Alberto não está sozinho em seu castelo. A namorada Charlene estaria instalada no pedaço, em temporada de verão. Os parapazzi rodeiam o château enlouquecidos. Há quem jure que viu a campeã olímpica boiando na piscina de Fontvieille, depois de treinar boas braçadas. E mais: na semana passada ela esteve fulgurante em todos os eventos da saison. Juntos, os dois irradiam felicidade e cumplicidade, provocando especulações de que estariam prestes a ficar noivos...
***
Seguindo a tendência mudial de se usar tecidos de roupa em estofados (só deu isso na Feira de Milão), a arquiteta Risoleta Medrado baixou na Casa Simão para comprar, por apenas R$ 24 o metro, o tecido que revestirá a poltrona de seu living na mostra Morar Mais por Menos, que abre no dia 5 de setembro...

12.8.06

Da série E-mails Surreais #2

Episódio de hoje: de como Italo Calvino pode lhe fundir a cuca.

(Contexto: eu morando alguns meses na casa de uma amiga que estava passando uma temporada em Portugal -- isso tem (já?!) cinco anos)

Bem, tenho que te contar uma coisa que aconteceu aqui. Há pouco mais de uma semana, acabei de ler os dois livros do Gutiérrez, o cubano. Era um dia de noite, não lembro se domingo ou segunda, e ainda estava relativamente cedo para dormir, queria continuar lendo. Aí resolvi: é hora de atacar a biblioteca! Vim até aqui o escritório, fiquei olhando, olhando, escolhendo, até que me decidi com relativa facilidade para o livro de que todos falam, Se Numa Noite de Inverno um Viajante, é claro. Hmm, edição portuguesa. Que aventura, pensei eu. E lá fui ler. Tem umas introduções muito chatas, uns estudos literários sobre o livro, que logo pulei. Comecei adorando muito o livro. Cheguei a rir alto várias vezes quando ele vai descrevendo o Leitor entrando na livraria para comprar "o último do Italo Calvino" e passando pelos Livros Que Tens Intenção de Ler Mas Antes Devias Ler Outros, Livros Que Podes Deixar de Ler, Livros Que Todos Leram Portanto É Quase Como Se Os Tivesse Lido Também Tu etc.
Muito bem.
Estou lá encantada com a leitura quando de repente -- estou lendo deitada na cama -- viro uma página, abro o livro um pouco mais e pléc, ouço um estalar estranho. Me reviro na cama e pá! Cai-me na cara um caderno inteiro desta porcaria de edição mal colada! Não acreditei, entrei em pânico. Meu Deus, o livro de S! A única recomendação que ela me fez! Cuidado com os meus livros, não os empreste etc. E eu vou logo no primeiro que leio e arranco um pedaço! Quer dizer, arranco não, caiu sozinho, é uma droga de edição que tens aqui. Como o livro é todo metalinguagem, ainda tive um rasgo de esperança de ler na linha seguinte algo como "e agora cai-te todo um caderno, e entras em pânico. Será que o livreiro vai trocar?". Mas não, nada disso aconteceu. Mas olha, a edição é tão ruinzinha que já achei até uma linha fora de lugar (a última linha de uma página foi parar na última linha da folha seguinte; para sua informação, é no romance No Tapete de Folhas Iluminadas Pela Lua, que é um romance japonês). Será que é proposital? Bem, enfim, estou aqui confessando meu crime. Aí, das duas uma: ou vc compra uma edição portuguesa por aí (esta daqui é da Editora Vega, 3ª ediçao, 1993) ou eu compro uma da Cia. das Letras por aqui.

11.8.06

Zuzu

Eu até estava com vontade de ir ao cinema ver o filme da Zuzu Angel. Mas aí a Cora Rónai decidiu encurtar as férias e antecipar em uma semana a sua volta às colunas de quinta-feira do Segundo Caderno do Globo só porque gostou tanto do filme que queria falar sobre ele. Ela não se conteve! E eu não agüento essa senhora que se acha a super cronista. Só por isso já perdi um pouco da disposição para o filme.
Mas no fundo eu vou acabar vendo, porque gosto da Patricia Pillar. Reparem como ela fez tão bem, nos papéis que interpretou, a transição de idades: de jovenzinha (na primeira versão da Sinhá Moça), para casa-dos-20-ou-30 (O Quatrilho), para mulher madura, mãe de adultos (atual Sinhá Moça e Zuzu Angel). Sempre lindíssima, e simples, e com classe -- e, a bem da verdade, com a mesma cara.
Ah, bem, é verdade, ela casou com o Ciro Gomes, o que eu não deixo de achar meio estranho.

10.8.06

Ride palhaço

Di Cavalcanti, "Pierrô, Colombina e Arlequim", 1922
Andei conversando com M., ela muito braba porque um fulano aí abusou da sua confiança, prometeu mundo e fundos e depois sumiu, e arrumou outra namorada, e a maior cara-de-pau, aquela coisa toda. Como ela descreveu: "me fez de palhaça". Taí um sentimentozinho humilhante, ser feito/a de palhaço/a. Não só pela desmoralização pública da situação, mas também pela facada que é na sua auto-estima.
A conseqüência grave é que, depois de ser feita de palhaça, a pessoa tende a ficar desconfiada de tudo e de todos, nos relacionamentos seguintes. Faz tudo para não ser feita de palhaça novamente. Na cabeça de quem já foi palhaço, há sempre a iminência de descobrir, de novo, uma grande tramóia.
E isso é grave porque passa a ser muito difícil se entregar novamente a alguém, sem reservas. Confiar, com C maiúsculo, mais uma vez.
O que é uma pena. Porque é muito melhor viver um relacionamento pleno, de confiança total, de cumplicidade absoluta (ou pelo menos é o que você acha) e depois cair das nuvens e descobrir de que não era nada disso (uma enorme porrada, claro, quando maior a altura maior a queda), do que viver sempre com um pé atrás e nunca confiar plenamente no ser amado.

9.8.06

Da série E-mails Surreais

Episódio de hoje: como uma combinação de chope no Bar Plebeu vira um diálogo surreal.

(...)

Combinado Plebeu quinta, 21h.

Como diria sir Winston Churchill: "Sempre apreciei essa maneira de fazer negócios". Convocarei sir KM, que tal? Mr A estará conosco?

Very good idea, indeed. Sim, Mr A é quem pede esse horário de 21h, pois antes disso estará tomado por compromissos previamente agendados.

Yours truly,

Lady V

I have to say: this "yours truly" made me laugh. All right then. See you at Pesant.Thursday night, 9 pm.

Best regards.

Não é engraçado? "Yours truly" é uma despedida super formal, mas eu não consigo achar que não seja uma intimidade sem tamanho, como dizer "Sempre tua". Eu hein.

Yours truly me dá a mesma sensação. Imagino que eles devam achar isso bem mais reservados que uma despedida "a hug"...

"A hug" é muito bom. Acho que vou adotar. Aliás, "hugs". Ou, se for com mais cerimônia, "a hearty hug", um abraço cordial.Veja que assunto infinito, esse.Em alemão, usa-se muito Herzlich Grusse (informal, claro), que quer dizerliteralmente "cordiais saudações". Sacou? Herz, que parece Heart, que é coração, de onde vem cordial... Sacou? sacou?

Vivendo e aprendendo! Mas a hug é uma boa, né? Você manda um email para um autor estrangeiro e termina com:

That hug! Que é citando o ministro!

Hatoum! Saúde!

Cinzas do Norte do Milton Hatoum ganhou o Jabuti de melhor romance. Engraçado que li no mês passado. Sim, o cara é um Autor de verdade, com "A". Mas -- tem sempre um mas -- Cinzas do Norte não me causou metade da impressão de Dois Irmãos, o romance anterior dele.

6.8.06

Momento Querido Diário


E na sexta, depois de uma semana em que tudo parecia querer dar errado e os amigos não se entenderem mais, rolou um chope no bar na frente da praça, e todo mundo tão profissa que já foram todos jantados, então a conta foi só de chopes de águas, nenhuma comida, e cheguei a chorar de tanto rir uma meia dúzia de vezes, e no fim, às três da manhã quase chorei de pensar que ter amigos é a melhor coisa do mundo. E no sábado pude acordar bem tarde, e passar o dia em casa fazendo meus freelas encantados, e aproveitando a casa só pra mim, que tem um gostinho diferente. Até o Flamengo fazer um gol aos 45 do segundo tempo ("ô, ô, ô, o Obina é melhor que o Eto'o!"), e aí os guerreiros que foram ao Maraca me ligaram insandecidos, e fomos para o Capela comemorar, beber chope, e comer cabrito e javali, e todos eles irradiando uma felicidade tão intensa e sincera que me cativou, e saí dali pisando nas nuvens, para buscar H. em Ipanema e irmos para a festa de aniversário de G., numa casa cinematográfica em São Conrado, e como o Rio é mesmo uma pequena vila, chego na festa e dou logo de cara com P. e M., e pergunto Meninas! O que vcs estão fazendo aqui? Pssst! Somos penetras!, e daí pra frente a festa só melhorou, com tantas pessoas amigas, tantas risadas e tantas cervejas, a ponto de eu ter chegado em casa às cinco e quinze da manhã achando a coisa mais normal do mundo, e consegui dormir hoje até uma da tarde, e fui almoçar um cozido no Aurora com S., que me deu um presente simplesmente sensacional, um "book rest" para segurar os livros em pé sobre a mesa, e ficamos horas conversando como duas grandes amigas que não se viam há cinco meses, e de lá fomos na lojinha ao lado tomar um sorvete Itália de tapioca, e depois para o Torta & Cia. da Cobal que tem um café expresso bem forte. E aí voltei andando pra casa, mas bem poderia ter sido rolando pela Voluntários da Pátria, e tão contente com o dia tão bonito de inverno que elegi minha rua favorita de Botafogo, a Dona Mariana, quarteirão entre Voluntários e São Clemente, que tem prédios fofos e casas lindas, inclusive o Consulado do Líbano, veja você, logo o Líbano, que tem duas casas, uma na frente da outra, o consulado e a residência do cônsul, que são palacetes maravilhosos, e imagina como não devem estar por esses dias conturbados. Mas nada disso, nem mesmo a guerra, está conseguindo atrapalhar esse fim de semana, em que estou ébria de amor à vida. E agora o sol se põe.

5.8.06

Trago a pessoa amada em três dias, etc.

S. me ensinou uma simpatia, para que eu consiga o emprego novo que tanto quero. Eu nunca tinha feito uma simpatia* na vida. Mas S., veja bem, é uma supermegaultrahiper intelectual, que está terminando o doutorado em assuntos muito específicos, e coisa e tal. E me convenceu de que era tiro certo. Só faltou comprovar cientificamente. Porque, para além de intelectual, S. é de família mineira. O que significa que, além de excelente contadora de histórias, ela sabe esse tipo de mandinga. E fala que funciona com tanta convicção que eu seria uma imbecil se não me desse ao trabalho de ao menos tentar. Bom. Tive que escrever o nome da pessoa (o cara que ficou de me dar uma resposta sobre o trabalho, i.e., meu potencial novo chefe) num papelzinho branco, e cobrir com mel.
-- Mas eu não quero que ele se apaixone por mim, só quero que me dê o emprego! -- protestei.
E S., na lata, com a calma e a certeza de sempre:
-- Não é para ele se apaixonar, é para ele te favorecer.
(Só faltou completar com "sua tolinha!")
-- Não sei se tenho mel em casa. Serve maple syroup?
-- Não. Tem que ser mel.
No fim das contas tinha mel em casa. Escrevi no papelzinho, coloquei dentro de um xícara de café e derramei o mel, para adoçar o homem.
-- E cobre com filme de PVC, pra não dar formiga.
Sim, senhora.
A ver.

Parando pra pensar, é ótimo esse nome, né? Simpatia. Muito interessante.

Amar é...

... morrer de saudade quando ele viaja -- a ponto de quase chorar na hora de preparar a cafeteira para fazer café para uma pessoa só.
(Mas hoje ignorei isso, coloquei o mesmo tanto de sempre, para dois, e tomei tudo.)

3.8.06

JGR

Literatos de plantão: já viram? Edições comemorativas de Sagarana (60 anos do lançamento) e Corpo de Baile (50 anos). Em breve sai também a dos 50 anos do Grande Sertão:Veredas. O bacana é que há muitos anos não saía o Corpo de Baile assim num volume reunido. Foi o próprio Rosa que desmembrou em três outros livros: Manuelzão e Miguilim, No Urubuquaquá, no Pinhém e Noites do Sertão.
Então é isso. Comecem a economizar: oitenta pilas cada um.

2.8.06

Velhas novidades musicais


Me identifiquei muito com o post do Rodrigo em que ele dizia que perdeu a paciência para a música pop há mais ou menos um ano. Porque eu nunca tinha pensado nesses termos, e no entanto foi isso mesmo aconteceu comigo: perdi a paciência. Só que há muito mais de um ano. Dou graças aos céus por me manter em contato muito próximo (graças às listas de email) com meus amigos da faculdade, que me mantêm a par do que se passa na, digamos, contemporaneidade musical pop, indie, roqueira etc. Aí às vezes quando falam muito de uma banda, vou lá e baixo algumas coisas, para ver do que estão falando. Até agora não gostei muito de nada, a não ser do Cake (que já tem bem uns, o que? uns seis anos, por aí, desde que descobri), que virei fã. E tem umas coisas bem inusitadas, como o Sigur Ros. Mas enfim, pelo menos fico sabendo dos nomes e das tendências.
Já o rock e a música pop brasileiras, sou um zero. Aquele rapaz do Detonautas que morreu num assalto, por exemplo. Não tenho a menor idéia do que seja uma música do Detonautas. Nem sabia que era uma banda muito famosa. Não conseguiria reconhecer um sucesso do Charlie Brown Junior. Nem mesmo do Rappa. Outro dia teve uma capa da revista de domingo do Globo sobre a "música chiclete" "Ai ai ai" da Vanessa da Mata. Hã? Nunca ouvi falar -- talvez se alguém me mostrar, eu reconheça e diga "ah, é essa?". Mas sou incapaz de ligar o nome à canção. Acho que minha última atitude digna de nota em prol do pop-rock nacional foi ter ido ao show do Legião Urbana no Jóquei, no dia (ou na semana, não lembro) da morte do Cazuza. Daí você tira uma idéia do tempo que faz. (Em tempo: tenho as melhores memórias desse show, que foi ótimo.)
Mas o que mais me espanta nos meus amigos super antenados é a disposição que eles têm para "coisas novas". Eles vivem fuçando a internet atrás de músicas novas, novidades, bandas novas, nomes novos, tudo novo. Ok, alguns deles são DJs e, vá lá, a profissão exige isso mesmo deles. Mas outros não, são novidadófilos por puro gosto.
Já eu sou o contrário. Adoro descobrir coisas novas, claro. Mas não vou atrás delas. Por um motivo simples. Tenho uma quantidade abissal de música "velha" para ouvir, para degustar, para deglutir. Digo ouvir, ouvir mesmo, prestando atenção. E não fazendo outra coisa, que é como a maioria das pessoas ouve música.
Em 2004 fui vítima do surto de conjuntivite que passou pelo Rio de Janeiro. Nos dois olhos. Então tive que ficar vários dias em casa sem poder fazer muita coisa a não ser ouvir música. Uma boa alma me deu de presente a então recém-lançada caixa com todos os discos da Clara Nunes, cantora da minha predileção. Tenho ouvido desde então. Mas ainda não consegui ouvir todos os discos da caixa com a devida atenção, porque é tanta coisa boa que fico repetindo o mesmo CD dias a fio. E falando na Clara, lembrei que no sábado passado estávamos quietos no nosso bar minúsculo favorito, tomando uma cerveja, quando, sem mais nem menos, adentrou bar adentro uma roda de samba completa, oito doidos que tinham vindo de São Paulo visitar Paquetá (!) e cantar samba pelo caminho. Aportaram lá graças a uma cantora amiga, que lhes mostrou Paquetá. (Essas coisas surreais que acontecem e se não tem uma pessoa pra te confirmar no dia seguinte você acha que sonhou.) São uns caras que conhecem mais ou menos todos os sambas mais obscuros da Portela, graças a umas fitas cassete que, sabe-se lá como, foram parar nas mãos deles. E aí deu aquela vontade de ouvir os discos todos que eu tenho da Velha Guarda da Portela, em especial aquele primeiro, produzido pelo Paulinho da Viola. Então, lógico, toca a resgatar os discos do Paulinho, que eu os tenho todos. Paulinho que, como se sabe, é casado com uma irmã do Raphael Rabello, cujos discos todos estão saindo aos poucos em CD. E aí eu pergunto: como não ouvi-los várias e várias vezes, com a máxima atenção? E do Raphael é um pulo passar para o Radamés Gnattali, cujo centenário se comemora neste 2006, então é o ano para ouvir tantas tantas coisas lindas escritas pelo Radamés, como muitos arranjos feitos para o Orlando Silva, que tem uma caixa com três CDs lançada anos atrás que é pérola atrás de pérola...
Eis aí o meu drama. Uma parte dele.
A música estrangeira e a clássica ficam para um próximo post...

Imagem: Lou Dufrane (ldufrane.com)

1.8.06

Caindo pelas tabelas

Tenho andado exausta. Em parte por causa da vida social mega-agitada que calhou de acontecer nas últimas, sei lá, três semanas, com programas todo santo dia. (Do tipo: hoje só agüentei um programa pós-labuta -- o segundo, que era até mais legal, tive que dispensar por motivos de cansaço maior.) Em parte por causa dos freelas que pego, alguns para dar um upgrade orçamentário, outros para dar uma força para amigos, coisas que me pedem para escrever ou fazer, por pouca ou nenhuma grana, mas que faço por amor à arte, e para dar um molhinho a mais nessa vidinha profissional que anda estacionada.

Aliás, mais bolas foras do meu trabalho: primeiro, cortaram o acesso a todo e qualquer site que tenha a palavra blog. Fiz um escândalo, disse que era informação importante, trabalho e tal, e prometeram que vão abrir exceção pra mim (arrã, vou esperar sentada). Além disso, hoje tive que assistir duas horas de uma apresentação de como usar todas as funções obscuras do... Outlook! Funções super indispensáveis, tais como "Calendário" ou "Tarefas" ou "Agendamento de Reuniões". Francamente, não querem que eu continue trabalhando lá!!