3.3.07

Calvin, meu amor

Mexeu com meu coração a notícia de que a Conrad traz de volta às livrarias brasileiras livros de Calvin & Haroldo. A coletânea O Mundo É Mágico, recém-lançada, está hoje em primeiro lugar na lista dos livros mais vendidos publicada hoje n'O Globo, seção Infanto-Juvenil. É estranho que esteja entre os infanto-juvenis, mas não é de todo despropositado. Ainda que seja, a meu ver, voltada para adultos, a série Calvin & Haroldo tem um grande apelo para o público jovem, pré-adolescente e adolescente.

Já falei antes sobre como as revistas em quadrinhos foram importantes na minha formação. Parar de comprá-las e de lê-las regularmente não se deu de uma hora para outra. E nessa transição, os livros do Calvin foram muito importantes. Eu estava num ambiente conhecido (tirinhas), mas lendo algo que não era infantil, que me obrigava a refletir, e que me chamava a atenção para a ironia -- algo que eu identificava como eminentemente "adulto".


Minha história de amor com Calvin é bem antiga. Quando eu tinha entre 8 e 9 anos, escrevia um jornalzinho, no qual discorria sobre as coisas importantes para quem tem 8 e 9 anos. Falava de atualidades, de livros, tinha classificados, receitas, piadas. Geralmente era uma folha, frente e verso, datilografada. Não lembro a periodicidade, se semanal ou quinzenal. Meu pai me ajudava, e eu tinha alguns assinantes, entre amigos e parentes. Um dia, não me lembro como nem por que, ligaram de um programa de TV, daqueles de entrevistas no meio da tarde, me convidando para ir ao programa falar do jornalzinho (cujo nome era esse mesmo, "Jornalzinho"). Eu fui, falei sobre o meu veículo de comunicação, e graças ao programa consegui mais alguns assinantes, que, glória total, eu não conhecia. Eles pagavam assinatura e recebiam o jornal pelo correio. Meu pai mandou fazer um carimbo IMPRESSO, que barateava a postagem. Era o máximo.

Enfim, alguns números do Jornalzinho tinham quadrinhos, e o primeiro foi uma tira do Calvin, que na época saía publicado na Folha de S.Paulo. Eu era pequena, e achei incrivelmente engraçada a tirinha em que ele entra no armário para colocar seu uniforme e virar super-herói, mas em seguida fica com medo do escuro e grita pela mãe. Foi o início da minha paixão.


Alguns anos depois, eu devia ter uns 13, comprei os primeiros livros que saíram aqui, pela editora Cedibra. Calvin & Haroldo (1988), Algo babando embaixo da cama (1988), Yukon, hei! (1989). Mais tarde vieram Estranhos seres de outro planeta (1990), e A Vingança dos oprimidos (1991), este último um presente da minha mãe quando eu estava indo para os EUA passar seis meses, num programa de intercâmbio, em 1992. Lá comecei a comprar os novos livros em inglês: Scientific Progress Goes "Boink" (1991), Attack of the Deranged Mutant Killer Monster Snow Goons (1992). Mas as edições mais bonitas que tenho são da Warner Books, publicadas na Inglaterra: The Days Are Just Packed (1993), Homicidal Psycho Jungle Cat (1994) e There's Treasure Everywhere (1996).

Eu gostava tanto, que ficava fazendo adesivos do Calvin e Haroldo para colar no meu fichário da escola, no meu armário, no meu aparalho de som. Era um processo artesanal. Comprava papel-manteiga, colocava em cima do desenho e copiava por cima, com caneta preta (aquelas Paper Mate pretas finas, 0.7, lembra?). Em seguida cortava ao redor do desenho copiado, deixando uma margem. O passo seguinte era pegar um Contact transparente e cortar com o mesmo formato do desenho em papel manteiga, mas num tamanho maior. Abria-se um pouquinho o Contact, descolando só de um lado, e colocava o desenho no meio, entre a parte colante e a parte não-colante. Pronto, era um adesivo, que podia guardar. Depois era só abrir o Contact todo e colar onde quisesse. Eu fiz tanto isso.

Quando entrei no Orkut pela primeira vez, me inscrevi na comunidade Calvin & Hobbes. Tinha gente do mundo todo, principalmente americanos, indianos e brasileiros. Os não-brasileiros ficavam intrigados com o fato de Hobbes ter sido batizado aqui de Haroldo. Foi a primeira vez que parei para pensar nisso. Não tenho idéia do que possa ter motivado essa decisão editorial. Calvin não é um nome comum no Brasil, e nem por isso foi alterado. E Hobbes, com a referência do filósofo, dá ao personagem do tigre um caráter totalmente perdido na estranhíssima opção pelo nome Haroldo, que por si não siginifica nem remete a nada específico.

Eu amo essa cara que a mãe faz em algumas tiras

A comunidade do Orkut era muito legal (naqueles primórdios, época em que alguém ainda parava para ler mensagens em fóruns do Orkut), e passavam-se mensagens e mais mensagens relembrando as tiras preferidas -- algumas seleções específicas, como "qual a sua tira sobre bonecos de neve preferida?", esta aliás uma das minhas séries favoritas. Alguém da comunidade passou o link de um site onde havia todas as tiras, e eu passei um bom tempo (re)lendo algumas tiras todo dia de manhã, antes do trabalho.

Calvin & Haroldo é tão genial porque todos os personagens são muito elaborados, em sua simplicidade do dia-a-dia. Todos eles têm mil faces, todos são imprevisíveis, todos são bons e maus, virtuosos e calhordas em determinados momentos. Assim, todos são muito reais. Cada um de nós tem seus momentos Calvin, Haroldo, Pai, Mãe, Susie, Moe, Miss Wormwood, Rosalyn. Tanto que Pai e Mãe não têm nem mesmo nome ou sobrenome, a cidade onde eles vivem é qualquer uma, a escola não tem nome etc.

Acho difícil escolher o que mais gosto dentro do universo calvinista. Os diálogos com o pai são sem dúvida um ponto alto:


Ou nas suas críticas ácidas à arte contemporânea ou à academia:


As incríveis fugas do cosmonauta Spiff, as noites com a baby-sitter Rosalyn, a relação de amor e ódio com Susie Derkins, o mundo dos dinossauros, as contantes idas para a sala do diretor da escola, as tentativas do pai de "formar caráter", os monstros sob a cama, as brigas com Haroldo, a máquina do tempo e o duplicador, os bonecos de neve, os trabalhos escolares.

Nas mesmas histórias, o melhor e o pior de ser uma criança, o melhor e o pior de conviver com uma criança.


Para os fãs: visitem a lista de links sobre o assunto em http://ignatz.brinkster.net/clinks.html, e não percam o site onde se pode buscar tirinhas por assuntos ou palavras: http://www.transmogrifier.org/ch/comics/list.cgi

4 comentários:

Lord Broken Pottery disse...

Anna,
Gosto de histórias de amor. Lá no comecinho você fala da estranheza pelo fato da escolha infanto-juvenil. De minha parte cada vez mais me interessam as histórias infanto-juvenis. Com o tempo talvez fiquemos mais jovens.
Kisses

Carrie, a Estranha disse...

Nossa, eu amooooo Calvin e Haroldo. Já falei q meu filho vai se chamar Calvin! Rsrsrs...tenho vários desses livros q vc falou.

Minha história predileta - bom, difícil falar isso, mas é uma das mais prediletas - é uma em q o Clavin enche muito o saco da Susie e ela começa a reclamar: "Maldito Calvin. Ele vai ver só. Eu vou ter um monte de amigos. Aí eu e minha turma de amigos vamos fazer muitas coisas e não precisaremos dele. E seremos animados e felizes e ele vai ficar sozinho". Aí o último quadrinho é ela sozinha e falando: "eu tb queria ter um pônei". Pronto! Isso virou um código entre mim e minha irmã. Toda hora q a outra está sonhando muito alto a outra diz: e um pônei, vc não quer não? Ou ah, vc vai de pônei, né? Rsrsrs

Lembro tb de uma dedicatória q a minha irmã colocou no meu "Felino selvagem psicopata homicida". Para a minha irmãzinha selvagem. Hahahaha!!!

Desculpe pela empolgação. Escrevi demais!

Bjs

Let me COW your name disse...

Que texto. eu amava as tirinhas tb, as críticas, o tigre se chamar Hobbes e ele ser Calvin por conta do Italo. As dores, a relação com os pais, a imaginação. tenho várias tirinhas recortadas e guardadinhas :)

Anônimo disse...

Carrie, essa do pônei é muito boa. É fofa e enche os olhos d'água.
let me cow your name (hã?!), eu tb recortava as tirinhas. Se bobear tenho isso guardado em algum lugar até hoje.