Vejo toda essa comoção em torno da ação da polícia na Vila Cruzeiro e Complexo do Alemão como um grande circo. Um espetáculo midiático como outros que já ocorreram por aqui. A diferença positiva desta vez é que todo o show vem a reboque de uma política de segurança já em implantação há alguns anos, as UPPs. Que têm problemas, claro, que têm de ser pensadas para além de sua implantação, que merecem um olhar crítico, mas que, daqui do minha pequena ilha da fantasia em Botafogo, me parece a melhor política de segurança que o Rio tem em décadas. E pelo simples motivo de ser uma ação contínua, e não pontual. Por isso é que o grande ataque desta semana, o "Dia D" (e que incrível cara de pau do jornal O Globo de colocar ontem no texto da primeira página uma comparação com o desembarque das tropas aliadas na Normandia!), não me comove. Os 450 policiais vão e vêm, bem como os 800 soldados do exército. Nada disso vai mudar a situação significativamente enquanto o Estado não for uma presença constante e rotineira na vida de todas as pessoas.
Mas que diabo, estou a falar obviedades.
Melhor então falar sobre os filmes que tenho visto em casa, durante esse meu período de resguardo. Nos últimos anos fui tão pouco ao cinema, e tenho tão pouco hábito de ver filmes em casa (seja no DVD, no computador ou na TV), que não falta filme para eu correr atrás. Nas últimas semanas vi Bastardos Inglórios, Gran Torino e até o filme sobre a criação do Facebook (A Rede Social), que me pareceu uma loucura total, porque acho surreal que uma bobagem como Facebook valha esse tipo de dinheiro. (Call me old fashioned, paciência.)
Mas, fazendo um paralelo com o primeiro parágrafo deste post, o que vi também na semana passada foi a trilogia O Poderoso Chefão.
(Parêntese para clamar pela desnaturalização desse título brasileiro, essa absurda tradução para The Godfather. O Poderoso Chefão é o tipo de título traduzido que achamos que existe em Portugal e damos gordas gargalhadas com a falta de noção reinante. Mas não. Lá o filme se chama O Padrinho, é claro! E aqui, O Poderoso Chefão. Chefão, amigos, prestem atenção, que aumentativo mais ridículo para um título de filme desse calibre!)
Mas tergiverso. Não sei bem por que resolvi pegar o filme, acho que li algo sobre como foi o único caso em que um filme e sua sequência ganharam ambos o Oscar de melhor filme. Já tinha visto a Parte I há muitos anos, mas não lembrava de nada, a não ser de algumas cenas isoladas, como a morte de Don Corleone na plantação de tomates. Então sentei com vontade para encarar as 3 horas de filme, e para mim não resta dúvida de que se há um filmaço na trilogia, é o primeiro. Lançado em 1972, com Marlon Brando roubando totalmente a cena como Don Vito Corleone. Na verdade, basta a primeira sequência do filme para te deixar boquiaberto. É uma tomada longa, em que um personagem secundário conta uma história triste para o Don Corleone e pede sua ajuda para fazer justiça. Tudo é carregado no chiaroscuro, e a câmera vai abrindo até aparecer a mão do Marlon Brando, e em seguida todo ele, visto de trás. Uma beleza.
Mesmo assim, tem umas partes que eu, na minha suprema ignorância cinematográfica, achei meio longas demais (como a temporada que o Al Pacino passa na Sicília, ou a terrível sequência do produtor de Hollywood com o Robert Duvall).
O Poderoso Chefão II, de 1974, sofre muito com a ausência de Marlon Brando. Confesso que, nas 3 horas e meia do filme, acabei me aborrecendo um pouco com o personagem principal (Al Pacino) e sua eterna angústia e rancor em relação ao mundo. A sorte é a parte em flashback, que conta um pouco da história do jovem Vito Corleone, interpretado por Robert DeNiro, um bálsamo. Sim, naturalmente é ótimo um filme que sugere mais do que mostra, e que te dá coisas para pensar depois que termina a projeção, mas quando o filme acabou fiquei cheia de perguntas por responder (afinal, qual era o grande lance da presença do irmão do Frank Pentangeli no julgamento do Michael? como o jovem Vito sobreviveu sozinho em Nova York com 9 anos de idade em 1901? e principalmente, como ele passou de jovem trabalhador de mercearia a capo? só fazendo pequenos roubos com o Clemenza?! Fantucci não trabalhava sozinho, como pode não ter havido reação a seu assassinato?). Achei este o mais cansativo dos três filmes.
O Poderoso Chefão III, de 1992, é quase uma paródia. A crítica incensa a parte 2 como obra de arte e essa parte 3 como desprezível, mas eu confesso que esta última me entreteve mais. Tem a participação da Sofia Coppola como atriz, que é tão ruim, mas tão ruim, que chega a ser divertido. Tem também o Andy Garcia, que é tão caricato que a gente até esquece do filme e se concentra só em observar como ele é bonito. E, claro, tem o Al Pacino, que em 1992 já era um ator pra lá de consagrado, e portanto interpreta, basicamente, seu papel de... Al Pacino.
O curioso é ver como, ao longo da trilogia, a família Corleone vai se vendo obrigada a se atualizar em sua atuação mafiosa. Jogos, armas e putas, depois drogas, depois a política e a lavagem de dinheiro - e sempre a venda da proteção e a exigência da lealdade. Sim, os banhos de sangue se repetem em cada um dos três filmes (tem sempre um momento "acerto de contas", com vários assassinatos simultâneos), mas os métodos vão se sofisticando com o tempo.
E é justamente isso que parece não acontecer com a questão do tráfico no Rio de Janeiro. As milícias sugerem de fato uma "evolução" do crime mafioso, por não se prenderem a um só produto - ainda por cima ilegal - e por serem mais maleáveis, adaptáveis. Esse modus operandi dos traficantes, com bunkers e territórios demarcados, me parece cada vez mais inviável de sustentar, por ser caro, pesado, pouco prático. Imagino o que será a nova tendência.
5 comentários:
E você não falou o que achou do Gran Torino. Esta semana marido me contou de uma critica negativa que ele leu sobre o filme na Folha acho, e ficamos um tempo trocando ideia sobre a questao dos imigrantes e o quanto gostamos do filme apesar dos cliches, do (gran) finale, mas enfim, o que ficou da conversa foi que se nos não morássemos aqui talvez a nossa percepção sobre o filme fosse outra muito diferente.
Deixo aqui a minha indicação (Séraphine com a super Yolande Moreau). Eu estou como você, há anos sem ir ao cinema e agora correndo atras do prejuízo (ou não).
E a vida mais ou menos nova? As crianças? Bjo.
Isabella, gostei do Gran Torino porque gosto do Clint. Mas de resto, achei um pouco clichê demais, estava tudo meio na cara que ia se desenrolar como se desenrolou. Obrigada pela indicação, vou procurar esse filme (não ouvi falar ainda). A vida nova está indo, é realmente uma luta esse lance de duas crianças. Mas o pequenino está sendo ótimo, super bonzinho, quase não dá trabalho. A irmã é que está muito danada, mas enfim, vai melhorar. Néééé???!!
:-)
Beijos.
Também gosto do Clint. :)
A Estela passou todo o primeiro ano do nascimento do irmão super serena, até que no final daquele ano, toda a frustração e angustia que ela (talvez em 'denial') guardou, explodiu e eu me vi de repente com uma criança fragilizada, incapaz de por em palavras todo aquele turmoil. Foi preciso muita paciência, conversa e flexibilidade da minha parte para ajuda-la a processar e compreender tudo aquilo. Hoje, ela é uma criança muito mais flexível, capaz de solucionar seus conflitos e seguir em frente. É uma luta lidar com temperamento difícil.
A Mathilde vai ter os seus momentos. Difícil a criança ser indiferente a uma mudança tão grande, mas claro que vai melhorar. E eu nem preciso dizer que você tem uma cabeça e tanto para ajudá-la né. :P
o lance do irmao do frank , é que quando ele chega no comitê junto do Mike, o frank se dá conta que nao foi o Mike que armou pra cima dele , e por isso nao testemunha contra
Sobre o Vito sobreviver em Nova York tão novo , se vc nao prestou atenção , diz no filme que o dono da mercearia que ele trabalhava cuidou dele como se fosse um pai..
Postar um comentário